Fonte: Todas as crônicas. Rio de Janeiro, Rocco, 2018, pp. 73-74. Publicada, originalmente, no Jornal do Brasil, de 4/02/1968.

Entrei num restaurante com uma amiga e logo deparei com Carlinhos Oliveira, o que me deu alegria. Olhei depois em torno. E quem é que eu vejo? Chico Buarque de Holanda. Eu disse para Carlinhos: quando meus filhos souberem que eu o vi, vão me respeitar mais. Então Carlinhos, que se sentara na nossa mesa, gritou: Chico! Ele veio, fui apresentada. Para a minha surpresa, ele disse: e eu que estive lendo você ontem!

Chico é lindo e é tímido, e é triste. Ah, como eu gostaria de dizer-lhe alguma coisa – o quê? – que diminuísse a sua tristeza.

Contei a meus dois filhos com quem eu estivera. E eles, se não me respeitam mais, ficaram boquiabertos.

Então eu tive uma ideia e não sei se ela irá adiante; se for, contarei a vocês. Era chamar Chico e Carlinhos para me visitar em casa. Eu os verei de novo, e sobretudo meus filhos os verão. Falei dessa ideia e um de meus filhos disse que não queria. Perguntei por quê. Respondeu: porque ele é uma personalidade. Eu lhe disse: mas você também é, aos sete anos de idade ouvia tudo de Beethoven que tínhamos e pedia mais, tanto gostava e sentia e entendia.

Mas quero respeitar meu filho. Disse-lhe: se eu convidar Chico, se ele vier, você só aperta a mão dele e, se quiser, sai da sala.

Também achei Carlinhos triste. Perguntei: por que estamos tão tristes? Respondeu: é assim mesmo.

É assim mesmo.

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