Fonte: Toda crônica. Apresentação e notas de Beatriz Resende; organização de Rachel Valença. Rio de Janeiro, Agir, 2004, vol. II, p.30.  Publicada, originalmente, na revista Careta, de 4/10/1919 e, posteriormente, em Vida urbana, Brasiliense, 1956, p. 184. 

Ultimamente, com a criação de seções elegantes nos jornais, aparecem todos os meses novos qualificativos para nossas elegantes.

Já tivemos as “encantadoras”, já tivemos as “melindrosas”, agora temos as “vaporosas”.

Não acho mal nenhum nisso, porquanto a língua se enriquece e todos nós nos divertimos com esse enriquecimento transitório.

O que acho, porém, é que, às vezes, os termos são impróprios.

Encantadora, vá lá! Mas “melindrosa” para qualificar uma moça que não teme os perigos do cinema e os “leões” das esquinas...

Julgo que essas moças não são nada “melindrosas”, elas são corajosas e ousadas.

Por exemplo, eu, que sou homem e muito pouco “melindroso”, não teria a coragem que elas têm. Contudo...

Agora inventaram as “vaporosas”. São as mesmas “melindrosas”, que se rejuvenesceram com um nome novo.

É bom que isso aconteça, porquanto não é agradável que uma mulher envelheça. Tudo que for possível para evitar tão lamentável fato é bom, seja carmim, pó-de-arroz ou um novo qualificativo.

Só tinha a objetar era a impropriedade da nova designação.

“Vaporosas” parece querer dizer que essas moças estão desprendendo vapor.

Acho aí um pouco de indelicadeza. Uma moça deve ser sempre uma coisa útil; e o vapor só é útil quando está sob pressão.

Era só a crítica que eu tinha a fazer a essa novíssima designação para as elegantes da Avenida e da Rua do Ouvidor.

Se é pelo vestuário, seria muito melhor que fossem elas chamadas – “transparentes”.

lima-barreto