Fonte: Toda crônica. Apresentação e notas de Beatriz Resende; organização de Rachel Valença. Rio de Janeiro, Agir, 2004, vol. II, p.256. Publicada, originalmente, na revista Careta, de 22/07/1922 e, posteriormente, no livro Marginália, Brasiliense, 1956, p.89.
Nunca foi da minha vocação ser cronista elegante; entretanto, às vezes, me dá na telha olhar os vestidos e atavios das senhoras e moças, quando venho à Avenida. Isto acontece principalmente nos dias em que estou sujo e barbado.
A razão é simples. É que sinto uma grande volúpia em comparar os requintes de aperfeiçoamentos na indumentária, tanto cuidado de tecidos caros que mal encobrem o corpo das “nossas castas esposas e inocentes donzelas”, como diz não sei que clássico que o Costa Rego citou outro dia, com o meu absoluto relaxamento.
Há dias, saindo de meu subúrbio, vim à Avenida e à Rua do Ouvidor e pus-me a olhar os trajes das damas.
Olhei, notei e concluí: estamos em pleno carnaval.
Uma dama passava com um casaco preto, muito preto, e mangas vermelhas; outra tinha uma espécie de capote que parecia asas de morcego; ainda outra vestia uma saia patriótica verde e amarelo; enfim, era um dia verdadeiramente dedicado a Momo.
Nunca fui ao Clube dos Democráticos, nem ao dos Fenianos, nem ao dos Tenentes; mas estou disposto a apostar que, em dias de bailes entusiásticos nesses templos de folia, os seus salões não se apresentam tão carnavalescos como a Avenida e adjacências nas horas que correm.