Fonte: Diário Carioca, de 5/09/1953.

F.J.C.L. me sugere, em carta, que reúna umas 30 de minhas crônicas, publicadas no D.C., e faça um livro. A ideia, de fato fascinante, me levou a reler tudo o que tenho escrito, de fevereiro para cá, e devo dizer que não gostei, especialmente, de nada, que não me senti digno de livro em nenhuma. As histórias que contei, tudo o que inventei, as frases que fiz foram coisas escritas às pressas e, em 70% dos casos, o personagem era eu mesmo, com as minhas manhas e meus lances de astutice. Minha frase é mole e minhas palavras são enxundiosas. Meu assunto é maltratado e, quando não, toma um rumo de meia seresta que, embora deva ser agradável às mulheres, redunda em frequente personalismo, do qual procuro fugir de mil maneiras inúteis. Lendo-me e comparando-me aos outros, sinto-me lamentavelmente inferior, sem a força com que R.B. trata de si e de sua humildade ou escreve, de sua janela, sobre o seu mar de Ipanema, onde uma mulher e um voo de garça se transformam em tema e resultam em beleza literária. O grupo mineiro de PMC, FS e OLR faz uma escrita bonita, limpa, com uma esplêndida fartura de palavras exatas e, quando é necessário comover, passa de leve sobre a melancolia e aguenta uns 20 dias sem tocar em tristezas. Thiago de Mello, mesmo quando revoltado, repete o poeta que é. Rachel de Queiroz minha paixão de sempre, consegue uma média de qualidade de que ninguém é capaz, mantendo o seu bom humor, mesmo quando lamenta a morte de um cearense da sua meninice. Elsie Lessa, essencialmente feminina, cuida das coisas que vê com um invejável entusiasmo e, querendo, faz beleza no fim da crônica.

Diante desse confronto, o coitado de mim reconhece o seu apoucamento e só continua escrevendo muito porque acha que este é um método, um exercício de depuração: escrevendo muito, cada dia, menos frívolo e mais maduro, talvez possa alcançar e manter uma atitude literária mais serena e menos inútil. Por isso continuo e, se não fosse essa esperança – meu tão generoso F.J.C.L. – deixava, neste instante de contar histórias, dedicando-me à venda de automóveis que, com a ajuda de um banco, é o melhor negócio do mundo.

antonio-maria