Fonte: Caderno B, Jornal do Brasil, 5/01/1976.
Vou agora transferir nomes e endereços para uma agenda nova, pois a antiga ficou também toda molhada quando me joguei no mar, com roupa e tudo, para reverenciar Iemanjá. Uns nomes ficarão: outros não quero mais.
Na letra A deixemos ficar o Antonio’s, onde tenho ido ultimamente depois de longo afastamento. Manolo e eu nos entendemos e estimamos; os garçons me tratam com carinho, e 30% dos clientes são meus amigos do peito. Além disso, tantas foram as aventuras que vivi ali, quando era o meu bar de estimação, ou meu “escritório” — de tantos acontecimentos participei, tanto sofrimento escutei, tantos amores encontrei... Não, o Antonio’s não se joga fora: há ali um livro que cedo ou tarde vou escrever.
Temos em seguida isto: Aninha (?) Degrau, e um número telefônico. São tantas as Aninhas de Ipanema, gente boa; como vou saber quem é essa? E lhe direi o quê? Além do mais, ela já deve estar casada com um senhor ciumento; minha ligação pode resultar num drama conjugal. Deixemos então Aninha entre as que passaram na minha vida. Mesmo porque me sinto muito bem casado e não pretendo aborrecer a minha mulher. Os demais da letra A são todos pessoas finas; vão todos para o novo caderno. Mas da letra C vai sair um que se tornou meu amigo, quase um irmão, e depois se afastou e nunca me explicou a razão desse afastamento. Procuro na memória e não encontro nenhum indício de que o tenha magoado. De vez em quando sei de notícias suas pelos jornais: anda aí pelos iates da vida, e vai ver que simplesmente se cansou de frequentar a ralé. Não posso fazer nada, mas que me dói, dói.
Sem novidade vai indo a lista dos meus companheiros. Na lista Jota encontro o Jota-problema: ele se separou e não sei se levou o telefone ou o deixou com a mulher. Fazer tal pergunta pelo próprio telefone é coisa feia. Risco o nome dele, e o dela, esperando encontrar um ou outro ao acaso.
Essa de Niterói é doida. Entrou na minha casa com um senhor de Brasília, instalaram-se no meu escritório, fizeram amor cinco dias seguidos e depois foram embora e nunca mais se tocou no assunto. Quando telefono, me dizem que ela não mora mais em Niterói e que não sabem, nem querem saber em que parte deste mundo se encontra agora. Esta outra tentou suicídio; uma que é doidinha, encantadoramente doida, a mãe dela não gosta de mim e sempre me trata grosseiramente. Convém riscar.
A Soninha, tão graciosa, casou com um venezuelano e me disseram outro dia que moram atualmente em Katmandu.
Enfim, vamos até a letra Z e há três pessoas que estimo por igual. Ficarão aqui. E eu fico também por aqui, pois se há uma coisa que detesto é telefonar. Eles, se quiserem, que me liguem...