Nos bancos escolares ensinaram-me (apud Claude Bernard) que o caráter absoluto da vitalidade é a nutrição; porque, onde ela existe, há vida; onde se interrompe, há morte; mas não me disseram que, entre os seres humanos, o lado da morte é muito mais numeroso que o lado da vida.
Ensinaram-me que os alimentos fornecem ao homem os elementos que constituem a nossa própria substância. O homem é o próprio alimento. Mas não me disseram que há homens aos quais faltam elementos que constituem o homem. Homens incompletos, homens mutilados em sua substância, deduzidos de certas propriedades humanas fundamentais, homens em processo de morte.
Ensinaram-me, no modo condicional que sem o concurso de certos alimentos minerais e orgânicos, depressa a vida se extinguiria; mas não me disseram que depressa por toda parte a vida se extingue.
Ensinaram-me que o oxigênio é o primeiro elemento indispensável; mas não me disseram que só ele é um patrimônio de toda a humanidade.
Ensinaram-me que o carbono, o hidrogênio, o azoto, o fósforo e outros minerais são decisivos à vitalidade das células; não me disseram (por óbvio, mas eu era um aluno tão distraído) que eles não se encontram no ar que respiramos; e mesmo que se encontrem na terra comida por uma criança, seu poder de assimilação é nenhum.
Ensinaram-me que são os alimentos orgânicos ternários e quaternários; mas não me disseram que 60% da população do mundo passa fome.
Ensinaram-me que os alimentos ternários, constituídos pelas gorduras e pelos hidratos de carbono, são importantíssimos: mas não me disseram que mais de 10% dos homens estão sempre às portas da morte por inanição.
Ensinaram-me que o ovo, o leite e a carne eram alimentos extraordinários, mas não me disseram que em certas regiões os homens consomem ovos, leite e carne em quantidades muito abaixo das exigências do organismo.
Ensinaram-me que a sensação de fome é acompanhada de contrações gástricas, uma câimbra do estomago; mas disseram como se fosse uma simples dedução teórica.
Ensinaram-me que as vitaminas são substâncias importantes para o crescimento e para a saúde, e que a sua falta provoca doenças como o escorbuto, o beribéri; a pelagra, mas não me disseram nem onde, nem quantos (ou, se disseram, foi de forma tão fria, que não me tocaram).
Nos bancos escolares ensinaram-me muitas coisas: menos as coisas essenciais à minha condição de homem; não faziam parte do programa.