Estou novamente em luta com o cigarro. Este assunto há de ir e voltar, enquanto houver pessoas (e quantas) na mesma situação. Deve haver um jeito de acabar com isso de uma vez por todas. Mas qual? Sugeriram que eu passasse a chupar balas, e andei de jato tendo sempre na boca uma bala azedinha. Porém, o sabor ácido exigia por complemento umas boas baforadas. Disseram também que a solução racional seria trocar o cigarro por cachimbos. Arranjei três cachimbos e, quando dei por mim, estava chupando balas, fumando cachimbo e continuando fiel aos Hollywood sem filtro.
Depois de consumir dois cigarros, tenho necessidade de tomar um cafezinho; como dizem os mineiros, é assim que se faz a boca de pito. Assim, no correr do dia, bebo litros de café seguidos de dezenas de cigarros. E sempre com remorso. Sempre sentindo que só um escravo procederia dessa maneira. Porque o tabagismo me tira a fome, criando mais um problema.
Consegui, não faz muito tempo, ficar seis dias sem fumar. Meu trabalho estava adiantado e eu podia me entregar a essa disciplina. No terceiro dia já estava cheio de cacoetes, sem saber o que fazer das mãos. Sim, porque eu descobria possuir duas mãos e me ocorria uma suspeita bizarra: duas mãos é coisa muita para um homem só. Entrementes voltara-me o apetite; sentia o gosto da comida. Ia ao cinema, onde não se pode fumar, e depois da sessão entrava em outra casa para ver outro filme.
O cigarro não traz só desvantagens, não é só um condutor de veneno aos pulmões. Nas circunstâncias embaraçosas ele neutraliza a timidez, conferindo naturalidade aos gestos do fumante. Pelo modo como um homem fuma você pode intuir com quem está tratando. A primeira providência que nos ocorre, quando nos vemos diante de alguém que ainda não conhecemos, mas que se faz merecedor de respeito, é oferecer-lhe um cigarro. Logo após a primeira baforada, o diálogo se desata. Você empurra um cinzeiro na direção do interlocutor e um bom negócio pode ser combinado só por causa disso.
Alguns médicos já me descreveram o estado em que se encontram os pulmões de fumantes inveterados, quando submetidos à cirurgia. É lama pura; uma camada impressionante de gelatina escura.
Seis dias depois da minha deliberação bem sucedida, sentei-me à máquina para escrever. Logo me vi angustiado diante do papel branco. Andei de um lado a outro no escritório, li os jornais, consultei apontamentos, contemplei da janela a pobre paisagem de que disponho. Voltei a sentar-me. Pus-me a escrever automaticamente, registrando o conteúdo de minha consciência. É esse um jogo interessante e estimulante — no entanto, não tem valor algum. “Tatibitate. Pernalonga. Noites brancas”. Coisas assim. Na verdade, o motor rateia; está faltando gasolina.
Fiz uma bolinha com a página rabiscada, joguei-a ao gato para que este sonhasse ser ela um ratinho, botei outro papel na máquina... O tempo passa e nada. Dei-me por vencido. Servi-me uma xícara de café e fumei sucessivamente seis cigarros, um para cada dia de abstinência. E me lancei ao trabalho, frenético. Enquanto isso, uma pequena voz, lá dentro de mim, humilhava-me com este murmúrio: “Você não é escritor — é tabagista; quem escreve por seu intermédio são os cigarros” ...
Agora tenho alguns calmantes e estou novamente disposto a acabar com o vício definitivamente. Vamos ver.