Fonte: Diário de Notícias, de 8/10/1966.

A coisa mais importante no momento em matéria de música popular é mesmo Chico Buarque de Holanda. No meio de tantas composições sofisticadas e elaboradas, A banda é algo que todo mundo entende e que emociona todo mundo. É simples, tem graça e tem lirismo, é tão nova e tão antiga, é uma boa crônica cheia de poesia. Um amigo meu, ao ouvi-la, disse que estava vendo um filme de curta metragem, com a banda chegando, as pessoas se movendo, depois a banda sumindo, as pessoas retornando à melancolia da vida sem graça. Senti mais um balé. Confesso que me apertou o coração aquela moça feia que se debruça na janela pensando que a banda tocava pra ela.

Sem desfazer em ninguém, porque o Brasil é grande, saudemos Chico Buarque de Holanda como a bela novidade. Até assusta ver um rapaz tão novo fazendo as coisas tão boas e tão certas. Que a glória, que lhe vem tão fácil, não o atrapalhe. Que ele se cuide para não abusar, não fazer letras compridas demais; que se torne cada vez mais exigente consigo mesmo, para aproveitar seu claro talento natural. Até parece que já estou passando pito no rapaz; mas sou amigo de seus pais, de muito tempo antes do Chico nascer, e a um velho tio não fica mal ser um pouco rabugento.

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Estou na maior curiosidade de ver logo mais a exposição de Glauco Rodrigues na Relevo; o bom pintor gaúcho está em fase nova, mais para o lado da não-pintura, na base da arte feita com outras coisas; vamos ver. Um gaúcho que faz umas caixas de madeira com encanto plástico e lírico é Avatar de Morais, cuja exposição na Petite Galerie está se encerrando. No MAM, uma boa exposição de gravuras alemãs do pós-guerra e uma comovente retrospectiva de Fayga Ostrower, que seria dos melhores gravadores alemães se a família, tangida pela estupidez do racismo, não tivesse vindo para o Brasil quando ela era menina.

Fayga mostra seus trabalhos de 22 anos de desenho e gravura, um mundo de coisas belas; mas a safra melhor é mesmo a de 66.

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As crônicas aqui reproduzidas podem veicular representações negativas e estereótipos da época em que foram escritas. Acreditamos, no entanto, na importância de publicá-las: por retratarem o comportamento e os costumes de outro tempo, contribuem para o relevante debate em torno de inclusão social e diversidade.