No jornal, a notícia de um flagrante de adultério, onde se dá muita importância ao fato de um dos flagrados ser almirante. Pelo texto, o flagrante me pareceu ilegítimo, uma vez que a porta foi aberta à Polícia, espontaneamente, pela mulher flagrada. No apartamento, além dos flagrados estarem vestidinhos da cabeça aos pés, não havia nada que caracterizasse o adultério. Uma mulher, no interior de um apartamento com um almirante, pode estar fazendo mil coisas direitas, como troca de ideias (marítimas), sessão de discos na vitrola, compra de terrenos – que, do momento em que entra um almirante, seriam da Marinha. Por que, então, achar que a moça estaria a cometer desatinos? Se, na entrada da Polícia, fossem ambos encontrados em abraços e beijinhos, e carinhos sem ter fim, aí, sim. Mas não. A mulher tinha, no olhar, toda a autoridade de honradez intata, e o almirante, sentado em confortável poltrona, fumava um cigarrinho, no caso, um único gesto digno de um almirante (pena, não era batavo). Esta é a notícia, diante da qual o cronista lavra o seu protesto. Agora, passemos às considerações em torno.
Não há nada de maior mau gosto que o flagrante de adultério. Examinemos, inicialmente, a parte que promove a diligência policial, é claro, o marido. Que satisfação teria esse herói em ver sua mulher, ou ex-mulher, em atitude mais íntima, na companhia de outro homem? Depois, a causa dos flagrados. Imagine-se a situação de um casal, em trajes menores, diante de um marido ultrajado, um policial, um escrivão e três testemunhas. Não, os maridos, quando passados para trás ou para a frente (há maridos que depois de enganados melhoram de vida), devem tomar outras providências. Além disso, é preciso que se respeite o adultério. É pecado, é ilegal, é tudo o que se queira, mas existe desde os começos da humanidade. Como se pode, sem a menor consideração pelas razões sentimentais e pela coragem dos adúlteros, entrar-lhes de tugúrio adentro, com Polícia, escrivão e tudo? Não tenham dúvida, de todas as desafrontas ao amor infiel, esta é a de maior mau gosto. Marido enganado, quando já sabe que foi enganado, deve ficar quietinho, tocar a vida para a frente, largar (se puder) a mulher e não fazer o São Tomé, que sempre se deu mal na base do "ver para crer".