Fonte: Benditas sejam as moças: as crônicas de Antônio Maria, Civilização Brasileira, 2002, pp. 23-24.  Publicada, originalmente, no jornal Última Hora, de 28/11/1959.

Não encontrei, até hoje, uma só razão para que alguém se matasse. Leio todas as cartas dos suicidas, cada uma mais absurda e ingênua. A uns, falta dinheiro. A outros, amor de mulher. Que frágil, a humanidade, ao desejar, constantemente, ser amada e rica! Hoje, por exemplo, nos jornais da manhã, a notícia do rapaz que se atirou de um décimo andar, unicamente, porque era feio. Achava que as mulheres não o queriam para nada.

Dedico esta crônica a todos os homens feios do Brasil. Sendo um deles, posso falar com autoridade, em nome da classe. Fiquem certos, colegas, de que não há nada mais sem graça que homem bonito. São chatíssimos. Os verdadeiros canastrões da vida real! As mulheres já não os suportam e se bandeiam, aflitas, para nós, que somos confortavelmente feios, encantadoramente feios, venturosamente feios. Ai de nós, se não fosse a bobagem dos rapazes bonitos! Não se cuidam, colegas. Ou melhor, cuidar, cuidam do cabelo, do colarinho, da gravata, do terno e dos borzeguins. Feito tudo isso, acham que já cumpriram todos os seus deveres para com a Humanidade e Deus. Então, ficam aquelas figuras Ducal espalhadas pela vida, a dar um show de vaziísmo desastroso. Enquanto isso, nós, os privilegiadamente horríveis, vamos cuidando de fazer alguma coisa − fazer, já que não somos. Ou somos tanto por dentro, que não precisamos fazer nada por fora.

Vocês, meus caríssimos companheiros do Feiúra Futebol Clube, examinem, por aí, o enorme êxito dos feios. Frank Sinatra, por exemplo. Não há homem que dê mais sorte com mulher, no mundo inteiro. E é feio mesmo. Mas faz bonito tudo o que faz. Basta sorrir e olhar, para que elas não queiram mais sair de perto.

Coitado desse colega nosso, que se atirou do décimo andar porque a companheira de repartição (sua última esperança de sucesso) negou-lhe um encontro. Coitados de todos aqueles que repetem suspirosos:

− Ah, eu não dou sorte com mulher!

É engano, prezadíssimos irmãos! Eu, se tivesse pretensões amorosas e trabalhasse nesse ramo, em cada um dos meus fracassos lamentaria as desditosas mulheres que não dessem sorte comigo.

Conheço um homem que não tem nada de bonito. É gordo, baixo e passa dos 60.  Foi não foi, está com uma mocinha pela mão. Certa vez lhe descobriram um caso sensacional − uma mulher lindíssima, com quem ele teria dado suas voltinhas. Na roda onde estávamos, alguém fez a pergunta indiscreta de sempre:

− Que tal Fulana, é boa?

E meu gordo, baixo e velho amigo respondeu não mais:

− Ah, não sei. Sei que eu sou formidável.

antonio-maria