No Brasil não há outono, mas as folhas caem. Uma vez, fiz de brincadeira uma paródia deste verso e de outros. O poeta achou graça, mas tive o cuidado e o bom gosto de dar um sumiço na tal paródia. Quando ouvi de passagem que o ministério continuava a ruir, talvez efeito da chuva, pensei na antiga brincadeira. Sim, no Brasil não há outono, mas os ministros caem. Outono, não; parlamentarismo.

Pois é no parlamentarismo que os ministros caem com rotineira frequência. Era assim no Império, no século passado. Stabilitas só com o imperador. Estão sujeitos a uma implacável lei da gravidade, que os puxa pra baixo e os estatela no chão. Alguns se esborracham e contraem a triste partícula do “ex”. A ela se agarram como a uma tábua de salvação. De sobrevivência. Isso, aliás, acontece mais no presidencialismo. O ministro cai e se machuca. Ex-ministro: dói e é para sempre.

Mais ou menos como aquela interinidade do Pádua, que se transformou na sua hégira. A data máxima, que divide a vida em duas vertentes: antes e depois. O Pádua tinha sido uma pequena chefia burocrática interina. Mas pouco importa. Quanto mais insignificante o cargo ou a honraria, tanto mais vinca o titular. As pequenas glórias trazem o halo de um sol. Não conhecem o tédio. O Pádua entrou aqui sem ser chamado. Um intrometido.

Resisti à tentação de dizer que Capitu capitulou. Há até quem diga que Machado pôs nesse apelido familiar, como também no seu nome de pia, Capitolina, a confissão de que a menina estava destinada desde o berço à capitulação. Um estigma, não um enigma. Dois leitores me telefonaram exatamente assim: Capitu capitulou. Ministro, porém, não capitula. Não viram o Alceni? Para um cronista e um ficcionista que lida com esse material contingente da vida política, nada como a queda de ministros e do ministério. Um excitante prato cheio.

Está lá no Machado: a aspiração de ser ministro se esconde nas dobras absconsas da alma. Pode ser o maior abacaxi, como presumo que é agora. Mas ser ministro, ora, ora! A vaidade se mexe, buliçosa, rodilha de uma secreta serpente. No parlamentarismo, a ascensão e a queda podem se dar com as mesmas estrelas, que apagam e acendem. A vida precisa desse contraste. Mudando e substituindo, instável, desgastadíssimo, mal se equilibrando na corda bamba, voltando atrás, se desmentindo, o Collor busca a sonhada estabilidade. Parlamentarismo à vista?

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