O brasileiro é o povo mais paciente do mundo. Você vê essas filas por toda parte. Claro que não são necessárias. Tanto se fala em racionalização, mas a burrice está aí à mostra. Na fila indiana. Indiana já dá ideia de multidão. Um atrás do outro, dóceis, pensando na bezerra que morreu. Pode resmungar, mas contenha o protesto. Vêm o tumulto e a polícia. Até a morte.

Fila existe em todo o mundo, sustenta o do contra. A palavra é francesa. Detalhe da burocracia, outra invenção francesa. O burocrata, o rond-de-cuir, pelo menos está sentado no bem-bom. Nos Estados Unidos não é assim. Claro que é, contesta o outro. Na Alemanha, na Suécia, no Japão, fila por toda parte. É a massificação. Sociedade de consumo. Espere na fila. Se não está na fila, não tem vez.

Talvez seja isto mesmo, a vida. Arte de esperar. O dentista, o médico. O guichê no banco ou no correio. Encerrado. Dirija-se ao lado. Ao lado, a fila. Estou na fila de espera. Ou o mundo está superpovoado, ou chegaram na minha frente. O melhor da festa é esperar por ela. Saí da conversa sem dizer água vai. Ter calado é melhor do que ter falado. Reconforta.

E saí matutando. Espera o parente diante do presídio. Horas a fio, ao sol e à chuva. Lá dentro, o preso espera. A visita, o alvará, a revisão. A liberdade. Quem de fato a tem? Mas é preciso buscá-la. E merecê-la. Uns poucos drinques e me sinto livre. Livre e só. Vou andando pela rua. Ouço os meus passos. Lá está a janela acesa. Porque é tarde, está acesa a janela.

Contendo o sobressalto, ela espera. Pode não ser a mais dolorosa, mas é só ansiedade. A mãe espera a filha adolescente. Mãe largada, sozinha. E a filha na rua. Pior do que namorada que espera o telefonema que não vem. Na calada da noite, mil perigos rondam. A violenta cidade, que a filha, descuidada, ignora. Reza a mãe e confia. Não, não confia que a cidade lhe devolva a menina. Essa espera me dói. E nem sei se existem. A mãe, a menina, a espera. Existe a janela acesa. E a minha angústia.

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