O Brasil não tem memória. Todo mundo repete o lugar-comum. Vamos por partes. Que é que é a memória de um país? Não falo do patrimônio histórico e artístico. Este é um ponto pacífico, a que se segue a tradicional falta de verba. Quando se diz que o Brasil não tem memória, é também memória recente. Somos uma nação que esquece o que aconteceu ontem. Samba, soneto, futebol, tragédia — tudo.

Até há pouco tempo, dizia-se que somos um país jovem. Não é verdade. Já somos bem velhinhos e dava pra ter tomado juízo. Comparem com outras nações deste Novo Mundo. Os Estados Unidos começaram depois. Por aí, portanto, não pega. Mas uma coisa é certa. Ou era. Somos, ou éramos, um povo de jovens. Seja porque se morria cedo antes dos antibióticos e do progresso da medicina, seja porque se nascia muito, matusalém aqui era uma raridade.

Apesar de não ser fidedigno, o censo de 1991 dá sinais de que a faixa etária mais alta se alargou. Basta ver a fila dos aposentados. Se bem que há muita gente que se aposenta cedo demais, a começar pelo ministro do Trabalho e Previdência. Estamos nascendo menos e morrendo tarde, o que resulta no envelhecimento da população. No andar da carruagem, não demora e vai haver campanha para aumentar o número de filhos.

Até uns anos atrás, pra saber como era a vida num passado de 30 ou 40 anos, era preciso ouvir os poucos velhos sobreviventes. Gilberto Freyre andou recolhendo depoimentos de gente antiga, pra reconstituir o cotidiano dos tempos idos. Ecléa Bosi, muitos anos depois, recolheu lembranças de velhos em Memória e sociedade. Hoje temos os museus da imagem e do som. Uma tentativa de congelar o passado para trazê-lo de volta na hora que se quiser. Funciona? Acho que não.

Seja por preconceito, seja por falta de oportunidade, num mercado de trabalho cada vez mais impiedoso, o fato é que os velhos não têm entre nós muita voz ativa. Por sua vez, a faixa etária socialmente dominante, que é mais pra jovem, vive de costas para o passado. Nem tem por que mudar. O suicídio do Getúlio, por exemplo, é tão antigo quanto Tutancâmon. Na cabeça da garotada, é isso mesmo. Depois a gente diz que o Brasil não tem memória. Bobagem!

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