Dom Paulo Evaristo Arns, preocupado com a possível aprovação da lei capital, está cogitando de um movimento que se oponha à ideia fixa do deputado Amaral Netto. Se esse movimento vai ter nome, vai aqui uma sugestão: Mota Coqueiro. Trata-se do réu que em 1855 foi enforcado em Macaé, no estado do Rio. Mas é também o nome do personagem de José do Patrocínio, na história que escreveu a propósito do episódio.

Empenhado no combate à pena de morte, o tribuno abolicionista decretou a morte da pena, tal a repercussão do seu livro, publicado em 1877. Seis anos depois, em 1883, morreu o último carrasco, de nome Fortunato. O lugar ficou vago e foi esta a única sinecura que nenhum brasileiro quis postular. Os jornais sugeriram a dom Pedro 2º que não preenchesse a função. O imperador não disse que sim, mas de fato não nomeou substituto para o anjo da morte.

É possível que o fogoso José do Patrocínio tenha posto um pouco de fantasia no romance que escreveu. Mas existiu na vida real esse infortunado Manuel da Mota Coqueiro. Passou o tempo e, 22 anos depois da execução, apareceu em Campos o verdadeiro autor do crime hediondo. Foi em Campos, aliás, que subiu à forca o último condenado, em 1876, 13 anos antes da proclamação da República e da abolição da pena capital.

Há outros casos de grosseiros erros judiciais, como o do escravo cego Domingos Moçambique. O verdadeiro assassino apareceu anos depois. Supremo requinte, confessou que tinha comparecido à execução de Moçambique. A pena capital recaía de preferência sobre os escravos, cujo preço era ínfimo na bolsa da vida. As execuções no estado do Rio se explicam pela presença maciça do trabalho escravo na lavoura. Aliás, o negro Patrocínio era natural de Campos.

A pena capital causava tal repugnância que às vezes não se achava alguém disposto a fazer o papel de carrasco. Ainda em Campos, como em Barra Mansa, a execução chegou a ser feita por outro réu, também escravo, compulsoriamente convocado para a função. Pena de morte e escravatura andavam de mãos dadas. Quem sabe alguém se lembra agora de proclamar a escravidão, como diria o Stanislaw Ponte Preta. Assim se completa essa sinistra volta ao passado, que vem a calhar na hora da visita do casal Mandela.

otto-lara-resende
x
- +