Muito se tem falado da república das Alagoas, que está de novo na berlinda com a morte trágica do delegado Ricardo Lessa. É uma afronta, esse homicídio. É muito descaramento. Do ponto de vista da jurisdição e de outras tecnicalidades, o episódio é alagoano. Na verdade, é o Brasil. É uma ignomínia da nossa república, que começou aliás com dois marechais alagoanos. Mesmo porque a república das Alagoas é só um artifício.

Um grande escritor, que sozinho honra qualquer Estado ou qualquer nação, Graciliano Ramos, deixou uma legenda meio folclórica de seu radical pessimismo. Era alagoano. Foi prefeito de Palmeira dos Índios. Não matou ninguém, a não ser no romance Angústia. A violência que está numa obra-prima como São Bernardo pode ter uma raiz local, alagoana. Mas a violência não é entre nós privilégio de Alagoas. Quem puder atire a primeira pedra.

Anda aí um movimento separatista. Podia ser em Alagoas, em consequência do aborrecimento que lhe dá o excesso de exposição pejorativa no palco nacional. O palco nacional pede vítimas, pouco importa se inocentes ou culpadas. Pelo menos um bode expiatório. Bodes e cabras é o que não falta em Alagoas, como em todo o Nordeste. Há alguns anos que lá não piso, mas dizem que está cada vez mais pobre. Cada vez mais saqueado pelas lideranças oligárquicas, pensionistas da miséria que pretendem representar.

Há várias histórias do Graciliano sobre o seu pessimismo, com testemunhas oculares e auditivas que ainda estão por aí. No Correio da Manhã, o mestre Graça penteava os textos que mereciam melhor tratamento. Na sala ao lado do Costa Rego, também alagoano, ele pitava e trabalhava em silêncio. Digo porque vi. Num dia de especial mau humor, parou diante do mapa do Brasil dependurado na parede, enfiou o dedo em Alagoas e murmurou, sarcástico: “Bom lugar para fazer um golfo”!

Depois da prisão que sofreu, de suas memórias do cárcere, o velho Graça tinha razões para lhe agravar o temperamento pessimista. Com a situação como está, hoje há muita gente que gostaria de, no lugar do Brasil, abrir um golfo para a América do Sul. E há quem queira deixar de ser brasileiro, como esse pessoal que deseja criar uma república do pampa, lá no Sul. Separatismo a esta altura, tenham a santa paciência, é piada. Melhor ficar só com a república das Alagoas. Ou não chega?

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