Há palavras desagradáveis a despeito do que significam. E há palavras desagradáveis também pelo que significam. Exemplo: manicômio. Ser doido, ou meio doido, ou doidinho, pode até ter charme. Mas ser discriminado como doido e ser trancado numa casa de doidos não é nada agradável. Manicômio é isto: reunião de doidos. A palavra vem do grego e já nasceu antipática. Tal qual nosocômio.

A ideia de discriminar é tão velha quanto o homem. A ovelha negra, o fruto podre. O doente, mais do que uma ameaça, é o incômodo lembrete de que todos podemos adoecer. Melhor, pois, considerá-lo contagioso e afastá-lo. Séculos e séculos foi assim com a lepra. Mas nem é preciso que seja doença. O racismo elege um bode expiatório e o fecha no campo de concentração. Ou o massacra, em nome da saúde social. O manicômio é também um universo concentracionário.

Mas quem sabe definir o que é a higidez mental? Lá diz o Guimarães Rosa: “Ninguém é doido. Ou, então, todos”. Há sujeitos cheios de certezas. Não hesitam, não duvidam, não perguntam. Fariseus, decretam que o mal está nos outros. E os condenam. À morte ou ao manicômio. O manicômio é a morte no conta-gotas. Ou o inferno em vida. Chesterton disse uma vez que conhecia muitos homens cheios de certezas. Estavam todos em Hanwell. Hanwell é o manicômio de Londres. Ou era.

Porque a nova psiquiatria, como a antipsiquiatria, decidiu acabar com os manicômios. A ciência concluiu que hospício é uma loucura. Como toda sentença irrecorrível, o manicômio leva a irreparáveis erros trágicos. Vejam a história da pobre Camille Claudel, que era genial. Deu um belo filme. A família católica, o irmão poeta, todos permitiram que Camille apodrecesse mais de 30 anos no fundo do hospício. E Charcot já tinha passado pela Salpêtrière.

Por essa e por outras é que Basaglia acabou com os hospícios na Itália. No Brasil, discute-se agora um projeto de desospitalização dos doentes mentais. Há quem entenda que basta acabar com a palavra manicômio. Com a vantagem de ser risonho e bem escrito, o debate já está em O alienista, de Machado de Assis. O dr. Simão Bacamarte sem dúvida foi um pioneiro. E não era proprietário de manicômio. Ou, como queiram, de clínica de repouso. Todos eram loucos em Itaguaí. Ou só o dr. Bacamarte, que se internou a si mesmo. Um sábio.

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