A propósito desses dois alpinistas que picharam o Corcovado e se orgulham do feito, pergunto se não é o caso de sugerir uma reflexão sobre a atmosfera reinante no domínio da educação. Nem é só na educação. A coisa é mais ampla. Pode ser entendida em vários sentidos e se dirige a todas as idades. Tem a ver com uma palavra que também em inglês é um neologismo — permissiveness. A permissividade desembarcou aqui pelo fim dos anos 60.

Uma boa síntese dessa mentalidade foi feita em maio de 1968. Eu estava lá em Paris e vi o que foi o esplendor dos graffitti. O mandamento número um da ideologia dominante conseguiu uma bela síntese: é proibido proibir. O pessoal mais velho, sobretudo quando também mais conservador, não engoliu essa onda. Me lembro, por exemplo, do dr. Gudin, que morreu aos 98 anos de idade. Deu palpite até o fim, sem se importar com os que sempre aplaudem novidades e modismos.

Para o velho Gudin, a culpa era do dr. Spock, médico americano autor de um livro de 1946 que se transformou na bíblia das famílias modernas. Chama-se Common Sense Book of Baby and Child Care. Nada de castigo. Em 1974, o dr. Spock publicou Bringing up Children in a Difficult Time. Ele próprio andou revendo suas posições. Criança pede amor, está certo. Mas se havia exagero do lado conservador, também se exagerou do lado moderninho liberal.

Não se trata agora de distribuir culpas, até porque culpa é uma palavra que foi banida deste mundo. No vendaval que varreu este século, o que não faltou foi mudança. E muita coisa mudou para melhor. Mas agora, a um passo do final do século 20, é o caso de indagar se estamos de fato no caminho de mais felicidade e de mais bem-estar para todos, a começar pelas crianças e pelos jovens.

Aqui é que a porca torce o rabo. O Nelson Rodrigues deu aos moços um conselho na entrevista que fiz com ele na televisão. Saiu-se com uma boa blague: “Jovens, envelheçam”! A meninada está hoje mergulhada no facilitário. Tudo lhes é vendido pela porta larga da facilidade. Então o que sugiro é que se discuta se de fato o jovem dispensa dificuldades e obstáculos. Desafios, em suma. Tratados a pão de ló, cantados em prosa e verso, quem sabe busquem por sua conta uma forma de dificuldade. Daí os surfistas ferroviários e os pichadores. Será?

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