Eu pensava cá comigo: o Havaí deve ser assim como Recreio dos Bandeirantes. As ondas mais fartas, mais altas – e o pessoal falando inglês. Muitos turistas com camisa de havaiano. Sarongue, hula-hula. Essa imagem que o cinema americano promoveu e o Carnaval incorporou. Sem faltar o “lei”, aquele colar de flores naturais. Mas é a tal coisa: a realidade ultrapassa a imaginação. É tudo isto, o cartão postal, e é muito mais.
Nunca tinha me ocorrido, por exemplo, que as flores do “lei” tivessem um perfume. E forte. Agradável? Sim, muito. Me lembrou jasmim. Ou a dama-da-noite de Belo Horizonte de antigamente. Claro, com o perfume de antigamente. Por mal dos meus pecados, não me dei bem com o “lei”. Ou com o seu aroma. Muito agradável, mas me provocou alergia. Devia ser a evocação do passado. Um choque proustiano que me devolveu a Belo Horizonte de antigamente.
Meu nome é mr. Almeida, me disse o chofer. E perguntou se estávamos falando espanhol. Ao saber que éramos brasileiros, me disse por completo o seu nome: Manuel de Almeida. Gosta muito de bacalhau à Gomes de Sá, mas não sabe falar português. É americano. E havaiano de olhos azuis. Seu avô é que era português. O português está no mundo por toda parte. Mas ali em pleno Pacífico me espantou. De onde terá vindo o avô Almeida? Do Oriente, Goa, Macau, ou via Estados Unidos?
Pouco importa. Na Polinésia, um neto de português adquire logo uma aura familiar. Vamos deixar de bobagem: a raiz lusitana traz à tona o Brasil. Então me lembrei do Stefan Baciu. Romeno, exilado político, poeta, veio viver no Rio. Apaixonou-se pela nossa literatura. Foi ensinar nos Estados Unidos e deu com os costados em Honolulu. Professor emérito da Universidade do Havaí, lá é uma presença viva do Brasil. Está cercado de cartas do Manuel Bandeira e do Carlos Drummond de Andrade.
A voz meio surda (anda adoentado o nosso Baciu), me perguntou pelo Hermano Alves. E se é verdade que o Lêdo Ivo está satisfeito com a Academia. Queria notícia de todo mundo. E não sabia que o Paulo Mendes Campos morreu. Caiu então sobre nós um silêncio oceânico e nada pacífico. Isto aqui é o fim do mundo, murmurei. Ele me olhou, nostálgico. Está no Havaí há 28 anos. E tivemos juntos uma saudade fininha dos dourados anos 50. No Brasil, claro.