Que é que é o espelho da sociedade? Pode ser o romance, no rastro da definição de Stendhal. Para ele, o romance é um espelho que passeia por aí. Se você tentou responder, duvido que tenha acertado. O espelho da sociedade é o lixo. Sim, senhor. Se não sabe disso, então não sabe o que é lixo. Cuidado para na sua casa não confundir a lata com o prato.
Vamos começar pelo princípio. Ou seja: o conceito de lixo. Se você pensa que se trata de um conceito estático, que não acompanha a história da civilização, está muito enganado. No sentido amplo, lixo é uma coisa. No sentido restrito, é outra coisa. Quem entende de lixo começa por saber a trajetória que vem percorrendo ao longo dos séculos. Quando se chega ao lixo de hoje, aí se conclui que o lixo não mente.
Nunca mente. Veraz, o lixo só fala a verdade. E há um lixo que não é lixo. Parece, os ignaros pensam que é, mas não é. Um exemplo: sucata pode ser arte. Um traste velho de repente pode ser um maravilhoso objeto de decoração interior. Fique sabendo que não convém deitar fora o que não lhe serve mais. Não serve para você, que é um filho ingrato. Mas pode servir para outra pessoa e até fazê-la feliz. Lixo, portanto, ou o que parece lixo e não é, se dá, se troca, se vende e se revende. Ou se empresta.
Garanto que você não sabe o que é lixo inteligente. Há de ver que nem sabia que o lixo pode ser inteligente. Por isso é que vive poluindo o ambiente, que nem um burro. Não sabe que o lixo se recicla. Papel, vidro, plástico e metal, tudo pode ser reaproveitado. Sabe o que é biogás? Sabe vagamente. Como sabe o que é gari, o simpático trabalhador que limpa a rua que nós sujamos. Gary, com “y”, era o nome de um francês que veio ao Rio para criar aqui o serviço que hoje faz a Comlurb. Sabia?
Há de ver que você ainda é dos que fumam — arre! — e não sabe que nicotina é uma palavra que deriva de outro francês, Nicot. Um fino diplomata. Mas foi ele quem no século 16 levou o tabaco para a França. Uma sujeira. “Poubelle”, sabe o que é? Os dois vagabundos de Samuel Beckett que esperam Godot estão cada um na sua poubelle. Sim, numa lata de lixo. Mas Poubelle também é nome próprio. De um francês imaginoso que inventou a lixeira. Isso e muito mais você aprenderá na Eco-92, se for ver no Paço Imperial a exposição “O lixo passado a limpo”, cujo projeto acabei de ler.