Diante do destaque que The Washington Post deu à reportagem sobre os índios ianomâmi, estou pensando se não é o caso de reformular o problema do nosso desenvolvimento. Os espíritos convencionais associam o conceito de progresso a uma caminhada para o futuro. Obcecados com a ideia de alcançar os que correm à nossa frente, desprezamos o tesouro do nosso passado.

Num acesso de bom senso, com direito ao romantismo, o jornal americano denuncia o veneno da sociedade do consumismo informatizado. A tecnologia de ponta é uma ilusão. De nada vale a conquista do espaço cósmico. Fora o duvidoso uso pacífico da energia nuclear. Nostálgico, The Washington Post se volta para o Brasil. O genuíno Brasil, fiel às nossas origens. Estamos quem sabe diante de um surto de neoindianismo. Vamos esquecer o Brasil que macaqueia o sonho americano.

O Brasil do sonho brasileiro já existe. E está, claro, onde convém. Na Amazônia. Saia de cena o “inferno verde”. No seu lugar, entre o “paraíso cor-de-rosa”. Nele já vivem os sábios ianomâmis. A natureza e a imaginação ali se juntam para instalar o reino da poesia. Lá tudo é ordem, luxo e beleza. Só por engano, e engano de bárbaros, o jornal se refere a esse edênico estágio da nossa cultura como a Idade da Pedra. Pedra coisa nenhuma. Idade do Ouro. Ouro também não é. Ouro sugere riqueza e cobiça. E nada disto impregna o puro coração ianomâmi.

Cá estamos de novo diante do bom selvagem. Com dois séculos de atraso, The Washington Post conclui que o homem pode ser feliz. Nunca é tarde para encontrar o caminho da verdade. Verdade e felicidade são aqui sinônimos perfeitos. Perfeição em carne e osso é o que exibe o grande jornal americano. Cansado de investigação e denúncia tipo Watergate, ele agora sabe o endereço do sonho. Rousseau foi apenas um precursor. Feito bom e feliz pela natureza, a sociedade é que deprava o homem. E o torna miserável.

Honra e glória do Brasil, ainda contamos com nove mil ianomâmis. Vamos esquecer a tentação diabólica do primeiro mundo. Queremos Collor de cocar domingo que vem. Sem camiseta. O busto nu. No lugar do jogging, a dança. Nada mais soft do que a inocência primitiva. Caça, pesca e colheita de frutos naturais. A salvação está no quarto mundo ou nos quintos do inferno. Perdão, do paraíso.

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