Publicada no livro Bom dia para nascer, Companhia da Letras, 2011.
RIO DE JANEIRO — Se alguém sabe, me conte quando é que começou essa moda do Dia dos Namorados. Há pouco tempo, passou o Dia da Aeromoça. Há aqui uma discriminação. Pois se há aeromoço, por que não dizer Dia dos Aeromoços? No plural. De resto, essa palavra aeromoço está caindo em desuso. A tendência é dizer comissário de bordo. Em Portugal, diz-se hospedeira do ar. Influência do francês: hôtesse de l'air. O americano é mais prático: steward. Comum de dois.
É o tipo da palavra, aeromoço, que poderá um dia figurar num dicionário com a data de sua criação. O neologismo foi bem recebido. Acho que foi o poeta Paulo Bonfim quem sugeriu o Dia da Aeromoça. Manuel Bandeira logo aderiu e escreveu um "Discurso em louvor da aeromoça", no qual apelou para o Vinicius: "Tu, que celebraste com tanto amor as arquivistas, vem agora celebrar comigo a aeromoça".
Quando havia trem entre o Rio e São Paulo, tentaram pespegar nas moças do restaurante o nome de ferromoça. Horrível. Felizmente não pegou. Em 1889, coisa antiga paca, o dr. Castro Lopes publicou Neologismos indispensáveis e barbarismos dispensáveis. Inventou cardápio para menu e convescote para pic-nic. Para pince-nez, propôs nasóculos. Ancenúbio para nuance. Para reclame, preconício. E para ouverture, protofonia. Houve muita gozação.
Mas voltando ao Dia dos Namorados. Cai no dia 12 presumo que seja porque é véspera de Santo Antônio, que é hoje. Santo Antônio é o santo casamenteiro. O amigo das moças apaixonadas, ou que querem arranjar um príncipe encantado. Franciscano, é também amigo dos pobres. Daí o pão de Santo Antônio, que é de graça, mas é um dia só. Precursor da merenda escolar. Ou da cesta básica.
Santo Antônio realiza proezas em matéria de achar coisas perdidas. É capaz de achar uma agulha no palheiro. Mas agora procurei um livrinho de Thales de Azevedo, sobre o namoro à antiga, e não achei. Santo Antônio deve estar muito ocupado. E depois pra que mexer com essas velharias? Vivam os neologismos! Por aí é que o namoro do PSDB com o Collor acaba pegando. Aconselho a prender o santo numa gaveta. E de cabeça pra baixo.