Tenham a santa paciência, mas agora a coisa está indo longe demais. Está bem, o Brasil sempre foi meio ciclotímico. Alterna a euforia com a depressão. Na virada do século, em 1900, o conde Afonso Celso publicou a patriotada que é Por que me ufano do meu país. Estava criado o ufanismo. Ainda agora reli o santo conde. Eu andava precisando de alguma coisa que me afagasse o ego de brasileiro. Uma sandice que fosse.

Fui depois atrás do Stefan Zweig. Brasil, país do futuro é um hino que nos lava a alma em água de rosas. Publicado em 1942, disseram que era encomenda oficial. Mentira. No mesmo ano de 1942 Zweig se matou. Em Petrópolis. E ainda levou a mulher com ele, num pacto de morte que Alberto Dines pesquisou e reconstituiu. Morrer no paraíso. Verdadeiro absurdo, se não fosse a guerra lá fora.

A culpa não era nossa. Tudo de ruim que havia aqui, e era muito pouco, podia ser debitado aos outros. Os cruéis alienígenas. Os dragões da maldade. O Brasil era apenas vítima. Nessa dependência de drogados vimos sustentando a nossa autoestima até que chegou o desenvolvimentismo. Vistos de hoje, dava gosto ser brasileiro na euforia dos anos dourados. De repente, sem mais aquela, estamos aí como um vira-lata escorraçado pelo mundo. Seria preciso ver o rol de ignomínias e de agravos que vim colecionando nestes últimos dias.

Leram o que disse o Nick Cave? Canta na Austrália e cospe na gente. E o outro, o Bob Dylan? O Brasil para ele é cólera e falta de esgoto. Tenho uma amiga em Boston que me manda de tempos em tempos recortes sobre o Brasil. Vou lhe pedir que cesse já de me pôr a par da cloaca que por lá chamam de Brasil. Ou Brazil. O professor Schwartzman nos acusa de sujar o primeiro mundo, ameaçado de ir à bancarrota por nossa causa.

Até entre os vizinhos estamos mal falados. Ou silenciados. Pior do que o ódio é a indiferença. Uma revista cultural da Venezuela dedica todo um número à ficção latino-americana. Nem uma palavra sobre o Brasil. Nem Jorge Amado! Um jornal, também venezuelano, pede a expulsão das prostitutas brasileiras. São 20 mil! Collor volta de Washington de mãos abanando. Que é que ele pode fazer? Sugiro uma radical mudança ideológica. Inverta já a mão. Deixe de descer e passe a subir a rampa do palácio. Com direito a hino, clarins e tudo.

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