De repente me bateu uma saudade danada da Suécia. Deve ser a viagem do Collor. Quando eu crescer, quero ser presidente para viajar assim. Não, não quero. Não gosto de viagem oficial. Nem de ambiente oficial. Tem muito discurso, muito protocolo, muita segurança e pouca sinceridade. Pelo jeito o Collor vai dar a volta ao mundo várias vezes. Aproveita enquanto é moço. E enquanto o Brás é o tesoureiro. Não duvido que amanhã faça jogging na Lua.

A primeira vez que eu fui à Suécia foi uma beleza. Como diz o anúncio, a gente nunca esquece. Éramos um grupo de jornalistas. O programa era puxado. Começava cedinho e para mim entrava pela noite adentro. Verdadeira ginástica sueca. Visitei fábrica subterrânea e andei de avião supersônico. Avião militar. Uma glória. E uma novidade.

Como detesto fazer compra (eu e o Rubem Fonseca), me sobrava tempo pra tudo. Comprei só um par de sapatos. Ingleses. “Church”. De sapato novo fui a Kíruna ver as minas de carvão. Vi o aço fino. Finíssimo. Mais fina só a família Erickson, que me acolheu em Atvidaberg, na guest house de sua mansão. A maior mordomia. Cheguei lá de sapato novo. E de avião, claro.

Em Estocolmo, quis ver a meninada cabeluda e contestadora. De barriga cheia, contestavam a sociedade afluente. Ainda não tinham descoberto a ecologia. Nem a Amazônia. Perguntei a um sociólogo por que tantos suicídios. Somos a pátria da máquina de calcular, disse ele. A mãe do computador. Nós contamos os nossos suicidas. Vocês contam os seus? O homem me embatucou: qual a taxa de suicídios no Brasil? Sei lá. Nem o IBGE sabe.

Em Estocolmo, ninguém olha pra ninguém. Nem para as moças bonitas. Em penca. Me senti invisível. Uma pomba teve pena de mim e pousou no meu ombro. Ninguém reparou. Na hora de partir, deixei de propósito no quarto os sapatos velhos. Onde eu chegava, chegava o par de sapatos. De hotel em hotel, só em Paris consegui me livrar deles. Aliviei a bagagem e concluí que nada como um país rico para evitar desperdício. O Primeiro Mundo tem um respeito religioso pelos sapatos velhos do Terceiro Mundo. O Collor não deixa lá nem um pé de chinelo velho.

otto-lara-resende
x
- +