Acervo familiar de DSQ.
Por favor, arrumem um espacinho na mesa do Portal para Dinah Silveira de Queiroz, a nova integrante do time. Ela, que já ocupou a cadeira de número 7 da Academia Brasileira de Letras – foi a segunda mulher a ingressar na instituição, aliás –, recebe agora, em caráter vitalício, a nossa banqueta de número 19.
Dinah foi uma “prosadora de mão cheia”, nos informa a professora Cláudia Thomé no perfil biográfico da escritora, e ao longo de quase 50 anos de carreira “publicou contos e romances de destaque, adaptados para o cinema e a televisão”. Sua literatura é excepcionalmente eclética, abarcando gêneros distintos como o romance histórico, a dramaturgia religiosa e a ficção científica, da qual foi uma das precursoras no Brasil. Correndo em paralelo, a crônica ocupou um lugar significativo em sua produção – foram mais de 11 mil publicadas na imprensa, segundo nos conta Dário de Castro Alves, diplomata com quem foi casada, em Dinah, caríssima Dinah, livro de memórias dedicado à esposa.
Sua vida de trabalhadora das letras está detalhada na linha cronológica preparada por Katya de Moraes. E, sua obra, disponível em uma seleta de 22 crônicas. Embora pequena, a amostra dá conta de transmitir o olhar sensível da autora, sempre embalada com naturalidade por aquele tom de conversa característico. A palavra falada, aliás, é um traço marcante seu, pois boa parte de sua crônica foi escrita especialmente para ser lida em voz alta, no rádio.
Sobretudo nas décadas de 1950 e 1960, vários programas de rádio incluíam leituras de crônicas em sua programação. O Quadrante, por exemplo, comandado pelo ator Paulo Autran na Rádio MEC, era integralmente dedicado ao gênero e batia recordes de audiência. Fez tanto sucesso que se desdobrou em dois livros antológicos. No geral, os cronistas reaproveitavam textos já veiculados em papel, mas Dinah escrevia sob medida para as ondas curtas, o que a permitiu assumir novas vozes e testar diferentes substratos literários – é por isso que às vezes se vê o vocativo “ouvinte” no lugar do tradicional “leitor”.
Falando em gravação, não deixe de ouvir “Casa para alugar” na voz de Bia Paes Leme, coordenadora de música do IMS, feita especialmente para esta estreia. A crônica, exemplo da poética de Dinah para as coisas pequenas, reconta uma visita da escritora a uma casinha “que se oferecia, toda branca e nova, para quem quisesse e pudesse”. Simpática, com jardim e terra em torno, a morada desencadeava um amontoado de sonhos nas mulheres que a adentravam em busca de um novo lar. No vazio da arquitetura, imaginavam as cores e os cômodos perfeitos, projetando ali a alegria de toda a família.
A casa desalugada era um palco à espera de seus atores. Quem sabe dali a pouco não alojaria uma família grande com direito a avó, papagaio e uma jovenzinha reclamona que se queixasse de tudo, sobretudo da mãe, sempre a discutir com fornecedores. Uma família cujo gato estranhasse em silêncio a nova posição do piano de gerações, encostado em uma parede estreita demais para seu valor ancestral. Uma família que despertará de madrugada com o choro de um recém-nascido, “pungentemente contando dos difíceis começos” da vida.
Seja como for, naquela casa “haverá alegria, haverá dívidas de dar nó na garganta, e festa de formatura, e discussões políticas”. “Ah, casinha que espera seus donos, branca e bonita como uma noiva menina”, escreveu a cronista, “compactos fantasmas de vida e de morte já te povoam, eu sei”.
Neste momento de redescoberta da laureada obra de Dinah Silveira de Queiroz, o Portal te convida a passear pela casa e conhecer a crônica de uma das grandes escritoras brasileiras.