Volta Redonda não parece Brasil; é, na verdade, uma ilha de trabalho e organização cercada de Brasil por todos os lados. E seu drama reside nisso mesmo, na necessidade incessante de se defender do Brasil e de suas loucuras, de sobreviver e de crescer para servir o Brasil sem se contaminar demasiado dele. No lugar dessas tristes ruazinhas de nossas cidades do interior, com sua poeira e suas casas de platibandas estilo comercial-futurista, seu mau gosto árido e obcecante, aqui há ruas cheias de árvores floridas, e as casas ficam atrás de gramados e jardins. Aqui houve quem pensasse antes de fazer, houve quem sonhasse e riscasse num papel seu sonho. Aqui se pensou um pouco no homem e em sua família, na casa e no clube, na escola e no esporte.
Certamente há ainda muito o que fazer. Certamente é preciso um esforço severo e contínuo para que a desorganização e a tristeza das favelas não prolifere em torno, para que a especulação e o egoísmo não envenene a paz de uma comunidade trabalhadora e tranquila. E dentro mesmo dessa vida há uma certa melancolia na formação de castas, inevitáveis, é verdade, mas cujas sutis barreiras devem sem cessar ser quebradas e aluídas. Como em outra cidade riscada por esse moço tão cedo desaparecido, Atílio Correia Lima, a bela Goiânia, vemos nessa Volta Redonda nova uma surpreendente tendência ao formalismo social, uma espécie de defesa de grupos familiares contra outros, um complexo de ex-acampamento que procura afirmar tradições capazes de se impor ao forasteiro – como se todos, afinal, não fossem forasteiros aqui. Mas tudo isso é Brasil; e nos alegremos em ver que há, na direção de tudo, um senso de democracia e uma preocupação ativa de abrir a cada um sua oportunidade de acesso, em dar a cada um certo mínimo de conforto sem o qual não subsiste a dignidade do indivíduo nem da família.
E como é orgulhosa essa gente de Volta Redonda, com sua comovida consciência do que está fazendo e do que pode fazer! Esse operário sujo, na boca de um forno de aciaria, fez questão de me dizer que aquela secção foi a primeira em que se dispensou completamente a assistência de qualquer técnico americano. Não que haja, qualquer prevenção contra os americanos – pois exatamente Volta Redonda é a mais bela prova de que pode haver cooperação sincera e honesta entre um país desenvolvido e outro retardado, principalmente quando isso é feito de governo para governo. O mesmo orgulho senti no engenheiro ao me dizer que as chapas do segundo alto forno, que ora se monta, já são de aço brasileiro. E há uma história, que não estou autorizado a contar, de uma poderosa firma estrangeira que perdeu um enorme contrato porque seu presidente julgou interessante propor a um dos diretores da companhia uma percentagem “por fora” se ele lhe garantisse a vitória na concorrência.
Esse sentimento de dignidade, de ordem de trabalho construtivo é o que há de melhor no espírito de Volta Redonda, nobre ilha do Brasil.