A coisa mais perigosa do mundo continua a ser uma tolice. Diz uma pessoa uma tolice e a diz gratuitamente, de alma leve, como em geral são ditas as tolices. Se ela desperta riso ou protesto, a pessoa se sente no dever de defendê-la, como quem defende um filho infeliz. E começa então a dizer e fazer outras tolices para salvar aquela.
Creio ser este o caso do general Inácio Veríssimo, autor, em um banquete, da frase profundamente tola de crítica ao regime: “basta dizer que o voto de um general vale tanto quanto o de uma lavadeira”. A função dos generais é defender o regime e não dizer tolices contra ele. O voto universal faz parte da própria essência do regime democrático, este mesmo que o general Veríssimo jurou defender. O general Veríssimo entende que o valor do voto deve depender da condição e patente: é lamentável que ele entenda isso, mas pode ser inevitável; o que na verdade é excessivo é que ele o declare em um banquete público. Ao contrário do voto, a tolice é que aumenta ou diminui de valor e efeito conforme a pessoa que a exerce. A tolice de uma lavadeira pode redundar apenas no estrago de umas cuecas; a tolice de um general pode causar graves transtornos públicos. Quando os estudantes, depois de atacados pelos soldados comandados por um capitão, foram ao Quartel General protestar, eles demonstravam ainda confiança no Exército. Demonstravam não acreditar que as altas autoridades militares aprovassem a estupidez de um ataque. Foram recebidos por um coronel, que teve esta bela frase: “agora é a hora da força contra o excesso de liberdade”. A força já tinha sido usada — a serviço da tolice. O que o coronel fez foi apenas acrescentar sua tolice (mais modesta, naturalmente) à tolice do general.
Não sei se o general Zenóbio da Costa é capaz de compreender o desserviço tremendo que esses seus comandados prestam ao Exército. Eles deveriam ser punidos porque, com leviandade e estupidez, atentaram contra a soberania de um Estado da Federação e criaram um grave motivo de queixa e ressentimento da população civil contra o Exército. Bela coisa neste minuto de nossa democracia! O momento em que todos os homens esclarecidos — com farda ou sem farda — sentem que é preciso defender nossa democracia contra os eternos golpistas, e sabem que ao Exército incumbe a responsabilidade maior dessa defesa — este é o momento escolhido pelo general Veríssimo para dar o seu lamentável e criminoso show de irresponsabilidade.
O crime dos estudantes foi levar para a rua a tolice que o general dissera em um banquete. Assim repetida e ampliada, ela deve ter parecido intolerável ao próprio general. “Ofensa ao Exército! Agitação comunista”! Essas tolices exclamatórias são lançadas em socorro da primeira. Este é o mecanismo de detonação, a reação em cadeia de uma tolice atômica — não de uma pobre lavadeira, naturalmente, mas de um general-comandante de Região.