Em 15 dias houve 15 crimes de morte em Santiago, o que é raríssimo. Ainda mais raro é que, desses 15, dois foram passionais. Os brasileiros que vivem aqui e os chilenos também se espantam; o Chile é, em toda a América do Sul, o país em que há menor número de crimes passionais. Acredita-se que os chilenos levam essa coisa de amor de maneira mais calma ou civilizada que o resto dos latino-americanos. Homens e mulheres gozariam de mais liberdade e por isso seriam mais inclinados à tolerância. É o que se diz; eu ainda estou muito novo aqui para poder confirmar. Mas o fato é que a estatística dos crimes “por amor” no Chile é confortavelmente idêntica à de qualquer Suécia. E os dois crimes em uma só quinzena abalaram a opinião.
O primeiro foi o de um homem que queria voltar a viver com a mulher e a matou porque ela não queria mais. Eram casados e separados, mas de algum tempo para cá se encontravam como amantes. A moça era de certo modo conhecida em Santiago por que há poucos anos foi candidata muito votada em um concurso de beleza.
O segundo crime foi no salão de chá do elegante Hotel Crillon. Chegou um casal — ela de seus 40 e tantos, ele de seus 30 e tantos — e pediu chá. Ela falava muito, em voz baixa. Ele, calado, olhava a janela. De repente ela tirou o revólver da bolsa e o matou com cinco tiros — na cara, no pescoço, no ombro, no peito. O homem (era gordo, Antônio Maria!) caiu para trás com a cadeira.
A criminosa é escritora com alguns romances publicados, e colaboradora de suplementos dominicais. (Cuidem-se, irmãos!). E estragou um pouco a pureza de um crime passional declarando na polícia que comprara o revolver para se matar e que não estava aborrecida somente por causa do amante não. Também porque o seu filho, já rapaz, a tinha abandonado indo viver no Brasil e porque um editor rejeitara suas três últimas novelas. (Cautela, José Olímpio!).