Estou há não sei quantos meses em Santiago, e sempre fui obrigado a confessar a meus amigos chilenos que não senti nenhum tremor. A verdade é que isso irrita um pouco meus amigos chilenos. Dezenas de vezes eles despertaram pela madrugada, com o leito a tremer e o lustre a bailar — ou, no meio da tarde, se quedaram um instante em “suspense” ouvindo roncos subterrâneos e sentindo estremeções. E ficavam depois um pouco despeitados — patrioticamente despeitados — quando, no lugar de contar meu susto, eu repetia que não sentira nada.
Foi assim que no dia 4 de novembro, às 18h45 da tarde, eu estava com o escritório cheio de gente quando um funcionário chileno se precipitou dentro da sala, me sacudiu pelo ombro e me disse com uma certa espécie de furor cívico:
— O senhor disse que nunca sentiu um tremor? Veja agora! Veja agora!
Meninos, eu vi. Os quadros dançavam na parede e a poltrona em que eu estava afundado oscilava para a esquerda e a direita, como se eu estivesse dentro de um navio em hora de tempestade. Essa impressão de navio é exata, mas pensando bem, o movimento não se parece com o jogo do barco em uma tempestade; lembrei-me, mais precisamente, de uma vez em que um barco em que eu viajava meteu o casco em um banco de areia, na foz do rio Doce. Aquele rascar desagradável e, além do empuxão para a frente causado pela parada brusca, um golpe de lado pela batida da onda. Já tive, e confessei, tanto medo em minha vida, que não me custa confessar, mesmo correndo o risco de decepcionar meus amigos chilenos, que desta vez não tive. Nosso sétimo andar dançava sofrivelmente, mas quando me ergui da poltrona para olhar à janela, o que mais me impressionou foi a agitação dos cabos elétricos no ar; pareciam a ponto de rebentar. Lá embaixo todo mundo deixara as calçadas e fora para o meio da rua, olhando os edifícios que oscilavam. Algumas pessoas corriam.
Ouvi gritos. Moças da sala vizinha se precipitavam para as escadas, e um velho funcionário do escritório, já de chapéu na cabeça e um absurdo guarda-chuva na mão (estamos no auge da mais perfeita e azul das primaveras em flor) falava em tomar o elevador. Essa ideia era inútil, porque os elevadores estavam parados — e de qualquer modo seria mais desagradável estar dentro de um elevador que em qualquer outra parte da república do Chile, durante uma tremedeira dessas.
Entre mortos e feridos estamos todos passando bem. À noite, em um jantar, cada um de nós contou o “seu” tremor. E eu me senti vagamente vaidoso em poder contar também o “meu”.