Li de uma assentada o Machado de Assis desconhecido de R. Magalhães Junior. Não sei onde é que esse Magalhães arranja tempo para fazer tanta coisa — teatro, política, jornalismo, literatura, traduções em prosa e verso e ainda por cima trabalhos como este, de pesquisa, de fuçar papel amarelo, ler páginas desprezadas, levantar cronologias, descobrir os donos de nomes obscuros perdidos em outro século. E não é só catar tudo isso. É também examinar tudo isso com espírito de crítica, e escrever depois um livro sem nenhum mofo nem bolor, cheio de movimento e vida, um livro que sai pela rua gesticulando.
Acho que ele não precisava se desculpar por meter o nariz nas coisas íntimas de Machado de Assis, visto que este morreu sem deixar descendentes que pudessem ficar aborrecidos. E não haveria, além do mais, de quê. O livro de Magalhães torna Machado de Assis mais simpático, mais boa praça, mais perto de nossa compreensão. É confortável e doce ver os pequeninos defeitos do grande mestre, como ele se repetia, citava errado, se descuidava.... Não fiquemos demasiados escandalizados por haver ele, pelo menos uma vez, enganado a nossa prezada Carolina com uma senhora de teatro. Mas o que o livro documenta principalmente é o interesse político de Machado de Assis, sua invariável fidelidade de liberal, seus arroubos nativistas, abolicionistas e democráticos. Depois de ler esse livro a gente sente o escritor mais humano, mais dentro de seu meio. Era, na verdade, um homem admirável e um cidadão altamente prestante, que sempre deu atenção e carinho à coisa pública, mesmo quando a idade já lhe fizera perder os fogachos primeiros.
Li num jornal, outro dia, que Magalhães Junior vai se candidatar à Academia. Assim não vale: elogia o velho, depois vai bater à porta da casa dele...
Mas também não haverá jeito de não recebê-lo; e nem queiram saber quanta novidade, quanta iniciativa, quanto trabalho vai inventar lá dentro esse Raimundo Mouro Magalhães Junior.