Moinhos de vento, medas de sal ofuscantemente brancas, quadras de salinas e a imensa lagoa transparente. Em Araruama e Cabo Frio não sei quem teve essa fantasia de plantar, além de flamboyants rubros e amarelos, coqueiros vindos do norte e eucaliptos, essas casuarinas que vemos por toda a parte, altas e delicadas, chorando ao vento. As casuarinas até na fita distante da restinga de Massambaba vão tomando conta da paisagem, dando um elemento vertical decorativo à sua imensidão plana. Pancetti já nos contou esses verdes e azuis, já distinguiu as cores dessas areias, às vezes tão brancas que semelham neve, como na praia do Pontal; sei que anda por aqui não sei onde, talvez na velha Saquarema — pois voltará com muitas casuarinas em suas telas.

Vagabundamos para um lado e outro, vamos até a lagoa Pernambuca, visitamos salinas pobres e a nova usina que está sendo erguida por técnicos franceses e que aproveitará uma série de subprodutos como o bromo, conversamos com os pescadores de camarão e os homens das barcaças que trazem mariscos (eles dizem “sambica”) para fábricas de cal ou cimento ou para alimentar criação; amigos compraram um sítio, prometem-nos para breve muito coco e muito caju; mergulhamos na lagoa e no mar e por toda parte topamos, sem querer, com nossa amiga, a Moça de Amor Novo, que se esconde com seu amado para ser reencontrada fatalmente horas depois por estes velhos escoteiros sem rumo.

Em Araruama dormimos no Hotel do Estado, administrado pelo Estado, e o homem de lá se toma de súbito amor por nós e tira uma conta particular sem taxa de turismo... e com certeza também sem escrituração. Oh, estado do Rio! Oh, Brasil! Mas no momento não estamos querendo endireitar o Brasil nem moralizar a administração Amaral Peixoto, pagamos alegremente e zarpamos para verificar que o tempo virou e, mais tarde, que um aviso posto em uma tábua em forma de flecha — “Desvio” — na estradinha do arraial do Cabo indica apenas ao viajor noturno um tredo lamaceiro sem saída nem volta. Afundamos. Afundamos lentamente. Todas as luzes do carro já se apagaram. O vento assobia, a chuva é forte, a escuridão completa. Vamos nos afundando. A lama nos afoga. Morremos. Daqui a quatro milênios, nossos corpos, conservados na lama, serão desenterrados e guardados em um museu com a legenda: “exemplares de viatura e quatro turistas brasileiros em 1955”.

Foi praga da bela e cruel Moça de Amor Novo.

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