Quando é que eu podia imaginar uma coisa dessas. Na minha infância, a despeito do chorrilho de homenagens puxa-saquista, nome de rua vinha de longe. E era simples. Rua Direita, em geral torta. Rua do Comércio. Rua Municipal (como se as outras também não o fossem). Adolescente, lendo o Rio antigo, tomei conhecimento da rua do Cano. Rua de Matacavalos. O Rio de Machado de Assis. A rua do Piolho. A dos Latoeiros, onde o Tiradentes foi preso.
Uma boa lei proibiu que se dessem nomes de gente viva aos logradouros. De passagem, diga-se que logradouro é como erário. Só pode ser público. Se tentam privatizá-lo, dá em CPI. Ainda bem. Esses antigos nomes têm lá o seu bem. Esses antigos nomes têm lá o seu sabor. Não foram batizados por decreto. Nem sugeridos no calor da hora de emoção. Ou na sôfrega reverência aos poderosos do dia. Mas a tal lei parece que não pegou. Mais uma. O Brasil aí por dentro está cheio de figurões vivíssimos e emplacados.
Aqui no Rio, a principal avenida do Leblon tem o nome de Ataulfo do Leblon. Ninguém mais sabe quem é. Ou quem foi. Pois foi membro da Academia Brasileira. Era escritor? Que é que escreveu? Não seja impertinente. Não escreveu nada — e daí? Sucedeu-o em compensação o José Lins do Rego. Em vez de fazer o elogio do Ataulfo, desceu-lhe a ronca. Mas não se meta com questões acadêmicas. Voltemos às ruas. Em Ipanema, fervilhando de garotas, está a rua Vinicius de Moraes.
Meus amigos foram às ilhas, queixava-se o poeta. Só agora entendo. Dos meus, muitos cometeram a descortesia de se ausentar. Não sei se foram às ilhas de arquipélagos ignotos. Silenciosos, vão virando rua. Ruas, avenidas, escolas. Quem vive no Rio sabe que temos telefone (péssimo), mas não temos catálogo. Não posso por isso procurar a rua Rubem Braga. Se existe e onde está. Sei que lá na Barra da Tijuca há uma rua da Borboleta Amarela. Homenagem ao sabiá da crônica. Sutil e lírica, tal qual o Rubem.
Agora, São Paulo se adianta. Entre Pinheiros e Vila Mariana, na altura do n° 1600 da avenida Uberaba, está sendo nomeada hoje a avenida Hélio Pellegrino. Vocês já têm aí e no caso serve de referência a avenida Juscelino Kubitschek. Se ainda não têm, arranjem uma avenida Mário Pedrosa. Tenho razão de me lembrar dele quando a prefeita Luiza Erundina inaugura a avenida Hélio Pellegrino. Justa homenagem ao amigo fundamental. Desculpem, mas eu gostava mais do Hélio quando não era avenida...