Há por aí poetas jovens bastante aflitos com a falta de espaço que o mundo de hoje reserva à poesia. Terá sido diferente no passado? Ao chegar aos 80 anos, idade até há pouco proibida aos poetas, Carlos Drummond de Andrade disse que não tinha ilusão. 15 dias depois de sua morte, estaria esquecido. Como tantos escritores, viveu de escrever na imprensa e de um lugarzinho público. Sua aposentadoria raiava o ridículo.

Ainda agora foi sancionada a lei que concede pensão à viúva Drummond, sua musa Dolores, companheira fiel de uma longa vida. Em valor atualizado, a pensão é de Cr$ 612.483,56. Pena que o poeta não esteja aí para glosar a pensão, o número e em particular o quebradinho de 56 centavos. Podia fazer com isto uma crônica, ou uns versos para a sua Viola de bolso. Quando se fala em pensão, a gente pensa logo na tença que foi dada ao Camões.

Além de épico, que cantou as glórias pátrias, o Camões perdeu um olho em combate. Duplamente herói. Mas a tal tença, atualizada, não iria além, se tanto, dos Cr$ 612.483,56 da viúva Drummond. Pelo mesmo padrão andaria a pensão com que se aposentou o Manuel Bandeira, outro que chegou aos 80 anos. Professor de literatura hispano-americana, o poeta não tinha sequer o direito de se aposentar. Foi preciso votar uma lei especial, iniciativa do deputado Carlos Lacerda.

João Cabral de Melo Neto ganhou agora o prêmio Neustadt. São 40 mil dólares, nada mau. O Neuestadt já contemplou Octavio Paz, Ungaretti, Francis Ponge e Elizabeth Bishop. Dizem que esse prêmio é o aperitivo do Nobel. Assim seja. O João Cabral o merece, como o merecem outros poetas brasileiros. Abgar Renault, por exemplo, altíssimo poeta, que acaba de completar 91 anos. Mesmo entre intelectuais, quem lê o Abgar? JCMN diz que a sua editora tem mais funcionários do que ele tem leitores.

Cercado por curiosos e repórteres, no auge octogenário de sua notoriedade, Drummond suspirou: “Ah, tivesse eu tantos leitores!” A poesia no Brasil não vive do público, porque ninguém lê, diz o João Cabral. Nem por isto os poetas entre nós deixam de alcançar o que bombasticamente se chama de o panteão da glória. Homero e Shakespeare talvez não tenham existido. É o que dizem a sério os entendidos. Existe, porém, a poesia de um e outro. Hoje, com a mídia, sabe-se da existência do poeta. Mas a poesia é uma incógnita. Ou apenas silêncio.

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