A natureza tem horror ao vácuo, não tem? Durante os governos militares, não se podia fazer política. Liberdade de informação ou de opinião passava por subversão. Partidos artificiais, eleições indiretas, governadores e senadores biônicos: o povo não precisava ser ouvido. Bastava ser tutelado. E o Brasil Grande vinha aí. A potência emergente. Ninguém segura este país.

Coincidindo com uma conjuntura mundial favorável, o milagre se impôs como assunto obrigatório. Até para divergir, era preciso falar dos indicadores econômicos. O desenvolvimentismo, com as metas, vinha do tempo do Juscelino. Já ali, nos anos 50, se falava muito em PNB. Ou PIB. Em taxa anual de crescimento. A estatística entrou em nosso dia a dia.

Acho que foi a partir de 1964 que o brasileiro deixou de ser o homem naturalmente político. Universal, a definição é de Aristóteles. Para combater o tutu do comunismo, viramos um animal econômico. A reportagem política, os colunistas políticos, os analistas e os intérpretes, os que aplaudiam e os que contestavam (poucos), todo mundo entrou pelo mundo da economia. E do economês. 

De susto em susto, de pacote em pacote, de choque em choque, passando pelos choques do petróleo, chegamos ao estado a que chegamos. O tigre da inflação dorme na geladeira, mas já tem data pra acordar. Preso, na rede das mil armadilhas que inventou, O leão do Imposto de Renda nos dá algumas noites de sono tranquilo. Outros bichos, mais ferozes, hienas e ariranhas, rondam a nossa fossa.

Fossa tem aqui o sentido de depressão. Depressão moral e depressão econômica. É o próprio governo quem diz que chegamos ao fundo do poço. Do fundo o Brasil não passa. Ou sei lá, quem sabe passa. Ou fica no fundo até dizer chega. Uma eternidade. Um paisão deste tamanho, no fundo do poço. Ou da fossa. Já pensou? É de amargar. De desesperar.

O jeito é acabar com essa chatice de índices econômicos. Vamos avaliar o Brasil pelo Ayrton Senna e pelo Nelson Piquet. Pelo show do Caymmi e do Tom Jobim. E respectivas famílias. Onde é que há maravilha igual? Há muito brasileiro bacana por aí. E lá fora está assim de pianista brasileiro. É o nosso PIB. “Pi” de piano e “b” de brasileiro.

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