Convencido de que não era um grande escritor, concluiu que seria ridículo de sua parte qualquer esforço para fazer estilo. O máximo de simplicidade, eis o que lhe pareceu um caminho honesto. Aí apareceu um sujeito e disse:
— Você está escrevendo com uma simplicidade danada de pedante!
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Os cabelos lhe nasciam tortos e alvoroçados. A gomalina o punha de uma cara antipática. Deixou as melenas à sorte que Deus lhes dera. Diziam que era “gênio” de sua parte. Um dia, entrou em um barbeiro, mandou rapar tudo à maquina zero. Era um homem humilde, tinha medo da morte, os cabelos não o preocupavam. Aí apareceu um sujeito e disse:
— Não há nada mais highbrow do que esse coco raspado.
Comprou então uma boina, cobriu o crânio liso. Aí apareceu um outro sujeito e disse:
— Querendo bancar o intelectual francês, hein?
Se fosse um indivíduo forte, é claro que seria soberanamente calmo, não brigaria nunca. Mas era fraquinho, precisava revidar insultos, para não ficar desmoralizado perante si mesmo. Sempre aparecem sujeitos que dizem:
— Ainda não percebeste que és fraco? E ficas aí com essa mania de dar em todo mundo!
Era também um pouco poeta. Datilografou uns poemas e lhes deu o título de “Aprendiz de poesia”. Apareceu um sujeito e disse:
— Mas que título mais pretensioso!
— Por que, uai?
— Pra cima de mim! No fundo queres mostrar que entendes de poesia à beça.
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Gostava de vida noturna. Diziam:
— Rimbaud, hein!
Passou a ficar em casa estudando.
— Solitário de Apipucos, hein!
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Não gostava de bichos. Davam-lhe um princípio de náusea. Sofisticação, comentavam. Uma noite, entretanto, vinha para casa meio alegre e deu na calçada com um gatinho meio triste. Miava, sem mãe e sem lar. Adotou o gato. Apareceu um sujeito e disse:
— Atitude!
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Diziam que malbaratava o dinheiro, que era pouco. Um amigo experiente o aconselhou a pôr o ordenado no Banco e ir retirando de acordo com as despesas. Um dia, o sujeito o viu assinando um cheque:
— Ficando pão-duro, hein velhinho!