Era um turista, com uma jaqueta fulva, a “kodak” da ilusão de viajar a tiracolo, já meio velho, em um ônibus que vinha do Leblon para a cidade. Em Ipanema, todos os bancos estavam ocupados. Quando a primeira senhora ficou em pé, o turista levantou-se imediatamente e, com os gestos prolixos de quem não fala a língua do país, ofereceu-lhe o seu lugar. Houve uma vaga logo adiante e ele sentou-se novamente, Entrou em Copacabana uma velhinha, e, outra vez, ele, cavalheirescamente, cedeu-lhe o lugar. A coisa começou a ficar engraçada: o homem conseguiu sentar-se de novo e de novo, no Lido, o ônibus foi invadido de moças e senhoras que não achavam lugar. O turista, desta vez, olhou para os presentes, viu que os homens sentados permaneciam indiferentes, resolveu também ficar indiferente. Lutou a princípio com a sua própria boa educação, disfarçou, fingindo que não via, que não era visto. Aí pela altura do Flamengo, já estava perfeitamente à vontade, sem importar-se com as senhoras que viajavam em pé, de todo integrado na paisagem nacional.

Moral: o estrangeiro se adapta depressa em benefício próprio.

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Tivemos a noite passada um sonho abstruso, literário e meio desenho animado. Éramos uma ilha deserta. Quando a ela chegou Robinson Crusoé, nós lhe inquirimos em tom oratório:

— Robinson, muito já se falou em você com relação a mim, mas nunca vieram perguntar a mim o que penso de você.

Robinson riu, escarninho, tirou uma bomba atômica do bolso e nos destruiu.

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A menina respondeu, depois de seu primeiro dia de colégio:

— É muito bom, mamãe, mas tem uma velha que atrapalha tudo.

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Psicologia de pedestre: os que, em uma rua movimentada fazem sinais aos motoristas, mandando que passem ou esperem, gostariam demais de ter automóvel, coitados.

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Psicologia de motorista: íamos em um lotação, que de propósito rodava incrivelmente devagar pela avenida Copacabana, irritando todos que vinham atrás. Em uma transversal, a dado momento, apontou um carro e, vendo que o nosso lotação seguia lento, quis atravessar a rua. A perceber isso, o motorista do lotação imprimiu velocidade a seu carro, avançou de um salto, furioso, ralou o para-lama do outro e o insultou com a ferocidade dos ultrajados.

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