Márcia tem 12 anos. Muito inteligente, suas amigas são em geral de uma geração bem mais velha, de 13 e 14 anos.
Márcia contou à sua mãe a desventura de uma companheira: a menina estava querendo namorar um menino, mas o menino não estava dando bola. Chegava a virar as costas. E disse Márcia: “Mas eu ensinei pra ela como a gente arranja namorado”.
A mãe pediu uma explicação e Márcia deu a seguinte receita para se pegar namorado:
“Você telefona às quatro horas para a casa dele: faz de conta que ele não está. Então, se ele não está, é porque a mãe dele pediu pra ele ir na padaria comprar pão. Então você pede dinheiro à sua mãe pra ir comprar pão na padaria e diz pra ela que você tem muito cuidado com os automóveis para ela não ficar com medo de você morrer atropelada. Aí, você vai primeiro no escritório de seu pai e pega um livro de filosofia. Você põe o livro debaixo do braço, mas com a capa escondida para ninguém ver o nome do livro.
Você vai andando pela calçada, fingindo de distraída e, aí, você encontra o menino, que vem voltando da padaria. Quando ele vê você, ele vê que você está com um livro e pensa que é livro de história. Então, ele para e pergunta: “Que livro é esse?” Você então vira o livro e diz: é livro de filosofia. Ele não sabe o que é filosofia e pergunta pra você: “O que é filosofia?” Aí, você começa a explicar pra ele o que é filosofia e ele começa a te namorar”.
A essa altura, Márcia interrompeu sua receita de apanhar namorado e perguntou para a mãe, que a escutava e olhava aturdida:
— Mamãe, o que é mesmo filosofia?
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Vinicius de Moraes veio do Uruguai no mesmo vapor em que viajava o jogador de futebol Ademir. Ficou espantado com a popularidade do craque entre os inspetores da alfândega: fosse Ademir um contrabandista, e seria ele o mais rico dessa classe próspera.
Observou ainda o poeta e crítico de cinema que a palavra ademir tem a estranha qualidade de servir para tudo, para todos os sentidos.
Se a festa estava meio pau, estava um pouco ademir; se estava ótima, estava ademir à bessa; se a pequena está meio indecisa, está ademir: se resolveu logo, foi logo ademir.