Há alguns anos atrás, um estranho relatório foi enviado ao Conselho Federal que governa a Suíça: um animal desconhecido tinha sido encontrado em um vagão de carga da estrada de ferro, em Zurique. O funcionário que tinha visto o “monstro” não podia descrevê-lo com pormenores, o bicho tinha corrido a grande velocidade e desaparecido misteriosamente sob uma pilha de ripas. Contudo, o empregado falava em um animal repelente, de asas compridas, escuro, dotado de antenas longas e vibráteis.

Os jornais de todas as cidades noticiaram o acontecimento. Uma onda de pânico ameaçava espalhar-se na cidade — como diziam os telegramas das agências estrangeiras.

A primeira providência do governo foi recomendar calma à população. A segunda foi submeter o ferroviário a um exame psíquico. Nada se apurou de anormal: o homem estava emocionalmente transtornado, e os médicos acharam isso razoável, mas não apresentava sinal de sandice, nem diminuição de suas faculdades sensitivas, não bebia, não fumava, era viúvo exemplar, com quase 30 anos de serviço impecável como sinaleiro ferroviário.

Afastada a hipótese de alucinação, as autoridades começaram a agir. Uma comissão foi nomeada para verificar a autenticidade do relatório e dar cabo do monstro. O local foi cercado por policiais armados, que velavam dia e noite, prontos para qualquer surpresa.

A Suíça começava a esquecer o ocorrido, quando a bomba estourou: uma velha solteirona, em Berna, dizia que tinha visto o monstro em sua própria casa.

Foi um deus me acuda nos quatro cantões. O povo começou a inventar coisas. Diziam que era o anticristo! Diziam que era o habitante de Marte! Diziam que o animal sugava durante a noite o leite das vacas. Um comitê político aventou a possibilidade de tratar-se de um animal feroz, obtido, através de cruzamentos diversos, pelos biologistas da Rússia: em caso de guerra, milhões desses animais seriam lançados pelos comunistas em toda a Europa.

As silenciosas noites suíças se tornaram ainda mais silenciosas, ameaçadas pelo monstro. O prestígio do Conselho periclitava. Cartazes de instituições e clubes particulares eram afixados nas paredes exigindo a captura do monstro.

Os fatos iam nesse pé, quando o animal foi visto novamente em Zurique, não longe do local em que aparecera da primeira vez, A coisa foi mais clara e mais bela. Um estudante de medicina, demonstrando temerária coragem, tinha perseguido o monstro com uma bengala. Mais do que isso, demonstrando sangue-frio e aplicação nos estudos, ele não teve dúvidas em classificar o animal como um inseto. “Talvez — disse ele à imprensa — se trate de um perigoso inseto dos trópicos, portador de um veneno de efeito letal, mas não tenho dúvidas de que estamos diante de um invertebrado”.

O governo respirou aliviado, mas não definitivamente. Se, por um lado, ficavam desfeitas as lendas em torno do animal, reduzido às suas dimensões (do tamanho de uma caixa de fósforo), a palavra INSETO veio causar no povo suíço uma repugnância indizível. As mulheres grávidas vomitavam mais. A população andava com um ar emareado, Todo o país começou a ter um cheiro forte de desinfetante.

O problema continuava. E não era só o nojo; muito provavelmente o invertebrado (era assim que se exprimiam pudicamente os jornais) era altamente venenoso.

O governo começou a expedir patrulhas armadas aos locais ermos e às habitações velhas. As sábias medidas tomadas pela Saúde Pública encontraram um embaraço: as medidas já eram rigorosamente observadas antes da aparição do inseto.

Finalmente, uma patrulha conseguiu sitiar um animal e prendê-lo em uma gaiola de aço trancado. Sensação em todo o país. Uma comissão de naturalistas o examinou e, depois de violentas discussões, concluiu que se tratava de um ortóptero da família dos Blatídeos, conhecida como Periplaneta Americana. Não era mortal ao homem, mas se tratava de um inseto repugnante, capaz de trazer grandes estragos às habitações, às bibliotecas, aos arquivos, etc...

A questão agora era saber como deveriam ser extintos os periplanetas. O governo suíço, informado de que o periplaneta era muito comum no Brasil, consultou, tomando todas as precauções para não ofender os nossos sentimentos patrióticos, o cônsul brasileiro em Berna, a fim de informar-se dos nossos processos para debelar o mal.

O cônsul agiu com discrição e sentimento pátrio. Disse, em ofício, que as baratas — ele viu logo que se tratava de uma barata — já não constituíam um problema sério no Brasil e que, ao contrário da marcha do sol e da civilização, esses insetos estavam se deslocando do ocidente para o oriente.

O presidente do Conselho deliberativo ficou pálido ao ler isto. Em reunião secreta, foi nomeada uma comissão mista, de químicos e de naturalistas, que deveria descobrir, com o máximo de urgência possível, um produto que exterminasse os periplanetas.

A comissão foi infatigável, trabalhando noite e dia, durante meses, em um laboratório adrede preparado. E foi assim que o homem descobriu uma das grandes invenções do mundo moderno: o D. D. T..

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