Outubro começou quente, as praias cheias, e no centro homens suados andando de paletó em baixo do braço, em Ipanema filas enormes na sorveteria do “seu” Morais, o Flamengo jogando e vencendo com estranho ardor. Apenas o sr. Getúlio Vargas fez um discurso para refrescar. Discurso de bom moço; ele apela para todo mundo, pede colaboração, e diz: “Não quero governar sem oposição, porque entendo que sem a crítica livre não há democracia”.
Neste ponto o sr. Getúlio Vargas pode contar com a nossa mais perfeita colaboração. Faremos o possível para que ele não governe sem oposição. Fica prometido.
Fora disso o grave é que perdemos (falsidade de um amigo que ficou de passar lá em casa e não passou) uma visita à Volta Redonda. Mas haverá outros sábados. E que vontade de viajar! Não estou falando em país estrangeiro não, minha vontade é ir a Guarapari, no Espírito Santo, nadar, pescar, dormir, sonhar, talvez, quem sabe. Ou então a Manaus, sair numa canoa beirando um igarapé do rio Negro, remando devagar.
A vida é curta, a gente vai deixando, vai deixando, e não faz as coisas. Fica neste Rio de Janeiro ouvindo discursos do sr. Getúlio Vargas, como há 20 anos atrás. Que falta de imaginação! Daqui a um ano ele empreende uma nova renovação de valores, nomeia o sr. Filinto Muller para a Chefia de Polícia — ou por que não o sr. Luzardo? — o sr. Francisco Campos pera o Ministério da Justiça — mas por que não o Vicente Ráu?
Sim, é verdade, eu ando triste. Mandei a carta ao prefeito pedindo para ele me arrumar um telefone, ele moita. Que fazer? Xingar o prefeito? Mas não vale a pena. Xingar a Light sim, isto faz bem à alma, e tem a vantagem suplementar de ser completamente justo. Porque essa coisa de petróleo, de siderurgia, está tudo muito bem; mas deixar a energia elétrica entregue a uma companhia voraz, imoral e ineficiente, isso é um atraso de vida inominável para o público e para o país também. Ela agora quer entregar os bondes à Prefeitura. Esperemos que a Prefeitura não compre esse monstruoso bonde. O que interessa não é bonde, é a energia. Só o que a Light gasta com montes de diretores de suas companhias, de advogados oficiais, oficiosos e secretos, de dinheiro e favores para os jornais, só isso daria para melhorar vários serviços públicos. Conta-se uma frase cínica de um ex-diretor: “um terço do Brasil está na minha gaveta; o resto está na fila esperando para entrar”. Será que nem em um momento como este, de luta contra o colonialismo, não aparece ninguém para organizar uma campanha ampla, decisiva, contra essa holding, para nacionalizar a energia elétrica logo que possível, ou pelo menos fiscalizar com eficiência verdadeira a concessão? Não são brasileiros os engenheiros que estão dirigindo a construção da Hidrelétrica de São Francisco? Não são brasileiros que dirigem Volta Redonda? Se já temos homens para enfrentar essas tarefas, por que continuar com a energia elétrica nos dois maiores centros urbanos e industriais do Brasil nas mãos de uma companhia estrangeira desorganizada e ladravaz? Convido o excelente deputado Afonso Arinos a fazer com que a UDN estude esse assunto: ela tem homens bastante bem informados para esmiuçá-lo e organizar uma campanha séria de libertação da energia elétrica brasileira. E que, como não teve no caso do petróleo, não tenha agora medo a UDN da imprensa vendida ao trust estrangeiro. Bola em frente, Afonso Arinos!
Está muito calor. E o calhorda do Joel Silveira viajando em navio refrigerado para a Europa, me deixando aqui, a labutar neste forno cívico! Até a semana que vem. E salve o Flamengo!