Rapaz 一
Escrevo-lhe no último dia de maio: este mês vai morrer em plena glória, todo vestido de azul. Vejo lá fora a luz do sol brilhando na copa das árvores, que o vento move. Não é a primeira vez que assisto a esse fenômeno completamente natural; mas confesso que tenho uma extraordinária facilidade de me encantar com as coisas simples; e afinal o sol é como o pão e a água, que a gente ama a vida inteira, e sempre recebe com muito gosto, mas, de vez em quando, nos dá um prazer novo e fino, como linda descoberta.
Passou, agora mesmo, uma jovem senhora, empurrando um carrinho em que ia seu bebê. Os cabelos brilhando ao sol, ela ia lentamente, olhando seu filho protegido pela sombra da capota; e ia sorrindo. Não sei se sorria para si mesma ou para o menino; seu sorriso era um enlevo calmo. Não a conheço, mas estimo que seu marido seja um homem forte e simples que a ame, e agora mesmo tenha saído para o trabalho, depois de um beijo e de uma palavra boa. Em todo caso, pelo menos neste momento matinal em que a vi, ela era feliz. E ser feliz um momento, assim desse jeito distraído, já não é pouco.
Quem esteve no Rio foi Maria: você não vai acreditar, mas ela, que sempre foi tão bonita, está ainda mais linda. Tenho por ela uma grande amizade: tão profunda e ao mesmo tempo tão leve que sua simples presença me fez um grande bem.
Carybé escreveu: fala do filho, que por ter jeito de pescador português, o padrinho Newton Freitas costuma chamar de poveiro: “o poveiro vai crescendo de noite, como as bananeiras”. Eu não sabia, ou não tinha reparado, que as bananeiras crescem de noite e não sei se foi Carybé que reparou isso, ou se é dito do povo; mas se ele diz é verdade, pois ele sabe as coisas.
Este mês eu vou a Cachoeiro, e quero ver se levo uns amigos: pena você não estar aqui. Mas ao mesmo tempo que quer levar gente, tenho medo de que não gostem da cidade 一 que afinal de contas, não tem nada de especial, a não ser o fato de ser uma cidade, o que me parece emocionante. Esse medo é misturado de um certo ciúme. Você que também é de uma cidade assim tenho certeza de que gostaria ou compreenderia.
De gente nascida e criada em cidade grande confesso que desconfio um pouco; sei que não há motivo para isso, e até pode ser anti-higiênico, mas acho que menino precisa andar descalço na terra para pegar sensibilidade. Afinal, isto é bobagem minha, vamos consertar dizendo: para pegar um certo tipo de sensibilidade. Que, em grande parte, eu perdi: reparei nisso com tristeza outro dia, fazendo esta coisa simples, mas sutil, que é pescar lambaris. Fazendo mal, velhinho: minha mão de homem não era sábia e sensível como a minha mão de menino. Apanhei dos lambaris: foi justo porque (também notei) eu segurava as minhocas com um certo nojo. A gente precisa amar os bichos, mesmo para matá-los. Aliás, em relação às mulheres.... Mas chega! Tenho escrito demais sobre esse negócio de mulheres! Adeus.