Capri, setembro – Quando se fala em indústria de turismo é preciso vir a Capri para compreender.

Para visitar a Gruta Azul escolhi o barco mais velho dos barqueiros, e tive sorte. Era um velho tagarela e meio infantil que foi bordejando lentamente a costa, contando histórias de sua vida e de sua família. Outros barqueiros mais moços passavam por nós e lhe gritavam chalaças amigáveis em seu dialeto bárbaro; ele praguejava, rindo, e ia ficando para trás. Ia me mostrando as pequenas grotas, dizendo seus nomes pitorescos, contando história sem cessar; e quando queria descansar um pouco os braços fatigados, largava os remos e fazia um gesto de admiração para a água azul e transparente, para as algas vermelhas ou cor de vinho, para o barranco fulvo, vertical, que parecia querer despencar sobre nós.

Esse velho é um artesão do turismo. Depois que vencemos, deitados no barco, a entrada da gruta que o mar, agitado pelo siroco, tampava de vez em vez com o arremesso de uma onda – ele se deixou ficar lá dentro quase meia hora. Batia com o remo na água azul turquesa, formando pérolas e chuvas de prata, animou a moça que ia em outro barco a dar um mergulho para ver como seu corpo ficava prateado naquela estranha e belíssima luz que parecia vir do fundo, e ficou a dar voltas pelos cantos para que meus olhos se acostumassem com o esplendor azul.

Quando saímos, chegavam três lanchas e um vaporzinho atulhados de turistas. Eles eram passados ali para os barcos a remo, que enxameavam. Eram metidos na gruta para uma volta rápida, aos magotes, e logo devolvidos ao ar livre para cumprir o horário da caravana. Ali fora o mar parecia uma feira livre, com empregados das empresas de turismo gritando para os barqueiros, moças vendendo lenços e corais, um funcionário público em canoa cobrando a entrada.

A Gruta Azul é explorada assim em massa, às pressas, transformada em uma usina poderosa da indústria do turismo. Os guias repetem depressa suas ladainhas mecânicas, mostram o trecho da rocha que parece uma cabeça de leão, a entrada da furna que a lenda diz ser o caminho de Tibério – e devolvem os fregueses aos seus horários implacáveis.

Meu velho barqueiro me mostrava isso com desprezo, e teve um gesto genial. Como o sol brilhasse mais claro no momento em que íamos voltar, ele perguntou se eu tinha muita pressa – e não me incomodava de pagar outra vez as 200 liras da entrada.

“Agora lá dentro esta ainda mais belo – você vai ver”. E entramos outra vez no dorso de uma onda para aquele mundo translúcido e misterioso. “Veja!” A mais de 15 metros, no fundo, a gente via os peixes pequenos, que passavam rabeando, em grupos, como os turistas.

“Mas eles não pagam entrada, pagam?” – eu perguntei. O velho soltou uma grande gargalhada e depois disse (o Sr. De Gasperi que me desculpe, mas ele disse) que esse miserável ladrão, esse porco desse governo é capaz mesmo de cobrar entrada aos peixinhos.

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