Somos homens de bem — Sergio Milliet, Joel Silveira, Ribeiro Dantas e este velho cronista. Se resolvemos, numa tarde doirada, sair ao mar na manhã seguinte, ao mar sairemos. Que chova aos potes, e vente o sudoeste gelado e se enraiveça o mar: sairemos. É verdade que saímos para dentro, quero dizer, para o fundo da baía. A lancha voa, mas o mar dá socos no seu casco e joga espuma em nossa cara; saímos. A Ilha das Flores, com suas belas árvores imensas, dá vontade de ser imigrante, de ter uma roupa de lã escura e um velho colete de veludo, de ser casado com uma pobre mulher loura e pálida, e ter um filho triste, de olho azul, de ter passado por muitos perigos e provações e estar agora cheio de esperança e de cafard nessa estranha ilha, deste país estranho, esperando, esperando.

E ter trazido um pouco da vida passada no bojo do velho baú: trapos antigos, papéis, cacarecos, pálidos retratos de parentes mortos ou perdidos.

Mas Paquetá dá vontade de ser rapaz e namorado, de moreninha talvez, ou talvez, como Jorge, da linda filha do velho senhor alemão. Ou de ser um príncipe melancólico na varanda do velho solar d’El Rei, diante das palmeiras imperiais e das mangueiras maternais, na tarde morrendo com cigarras cantando. Não, Rodrigo, não deixe o Barreto Pinto estragar essa casa: e cuidado porque ele é teimoso e pensa que a casa é dele, e não de d. João VI. Aqui dentro o velho barão de Vilas Boas, que serviu o último rei de Portugal, mexe com velhas gravuras e móveis antigos, mas vende ativamente helicópteros e escreve um surpreendente filme colorido com mulheres desnudas.

Nossos pés descalços pisam os mármores ricos da casa de Brocoió, depois a grama suave que vai até junto da praia; e as árvores são belas, mas eu plantaria aqui um fruta-pão, jenipapeiro, cajueiro... Voltamos ao frio vento, e ao frio mar.

rubem-braga
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