Quando saímos da sala escura ficamos um instante indecisos na galeria comprida. De um lado era a rua interior, a condução, a cidade. Do outro lado era o vento e o mar. Andamos de frente para o vento, em direção do mar.

Nas casas e na rua já havia luzes acesas, mas uma luz lívida e grave persistia na tarde revolta: o mar ainda era verde sob nuvens de chumbo e opala. 

Sob o forte e úmido vento o mar era túmido, e crescia em ondas muito além, ondas que estouravam em espumas e avançavam galopando, galopando, crinas da cavalaria marinha que o vento assanhava.

Em nossa cara vinha bater acre umidade, suor do mar, dos cavalos do mar, vontade de gritar: “Epa! Ruma! Alalá”! Mas ficamos quietos entre as coisas túrgidas que adquiriam volume na estranha luz de luares indiretos entre nuvens que passavam sobre o fundo de uma só imensa nuvem de dia fechado. Que bela morte, oh dia, com teu sol sem cores, mas de lívida força, com essa luz assombrando a tarde de vento!

Copacabana piscava luzes no ar molhado, sob manchas de sombra e prata seus edifícios tesos encaravam o mar. Andamos, havia pescadores remexendo coisas, redes e murmúrios sob as árvores escuras. Pisamos grandes folhas secas amarelas e acobreadas sobre a areia úmida, e de repente me voltei e vi teu rosto, era liso e pálido na luz, era firme e puro olhando o mar.

rubem-braga
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