É para junto do mar que voltamos outra vez, em um fim de semana. É bela esta viagem entre duas cordilheiras; há uma planura imensa de terra preta em que os grandes quadrados de ervilhas, de milho, de abóbora são divididos por fileiras solenes de álamos, eucaliptos ou plátanos altíssimos; aqui e ali há um pasto com o preto e branco das vacas holandesas, mais além um silo, um monte de forragem cor de tabaco, a casinha de um camponês. Mas há uma praga horrível na paisagem chilena: é o anúncio comercial. No Brasil conhecemos bem esse crime de estragar paisagens com anúncios; a nova moda de tintas fosforescentes veio agravar essa lamentável estupidez. No Chile, porém, há um produto que atingiu o auge do mau gosto, que estampa seu nome na mais humilde choupana do campo e da montanha, de norte a sul xingarei esse remédio, e conclamo quantos me lerem a não o usarem jamais, mesmo porque deve ser uma boa droga (no pior sentido da expressão) um produto que para se vender usa um mau gosto contundente e onipresente. Chama-se Aliviol o remédio ruim. Em segundo lugar vem um outro que conhecemos aí e que, não contente de entupir todas as estações de rádio com um slogan idiota, invadiu também o interior em sua fúria mercantil: Mejoral.

Saímos da estrada real, entramos por um humilde caminho de terra entre árvores; ao dobrar de uma colina está a aldeia que procuramos: é Pomaire. 

Era uma povoação de índios antes da conquista, e a gente que veio depois deve se ter misturado à gente antiga: Pomaire vive hoje como vivia há quinhentos anos, fazendo coisas de barro. 

São coisas ingênuas e lindas, feitas a mão, cozidas em um forno no fundo do quintal familiar. Porque esse artesanato é todo familiar, cada família parece ter uma casa (entrei em muitas) e no fundo da casa, antes da horta e às vezes da rocinha, há um pomar grande com parreiras, abacates, romãs, peras. É em alguma parte por ali que está o forno primitivo aonde se levam os vasos e as figuras da boa terra escura que tem não sei que reflexo verde. Demoramos ali, tomamos chincha entre porcos e marrecos, conversamos com essas oleiras e escultoras primitivas, depois vamos visitar a exposição feita na escolinha do lugar, onde se estão vendendo as coisas de barro. Pomaire é apenas uma rua.

Mas o dia era bonito e a “chicha” era boa, e a cara morena daquela gente simples e suas panelas, seus patos, suas vaquinhas de barro, tudo tinha um ar de família, de brinquedo e de chão.

rubem-braga
x
- +