Imagens & imagens
Aquele foi um Natal-Ano-Novo espetacular. Todos recebiam e davam presentes úteis, inúteis, mistos, indefinidos e outros. O repórter saiu indagando o que havia sido ganho por quem, e para quê. E assim colheu, entre muitas, estas respostas:
Que foi que ganhou a formiguinha?
Um calendário. Guardou as folhas para roê-las durante o inverno.
A roseira?
Um guarda-chuva. Teve de furá-lo com um espinho, para receber o raio de sol que ela tanto ama.
O professor de física nuclear?
O beijo de uma aluna, que ele estampou no lenço e depositou na caixa de charutos vazia.
O pequenino Yorkshire Setter de Mitzi?
Um corte de pelo em forma de árvore-de-natal, que quase o enlouquece, quando o garotão do vizinho quis acender velinhas em cima dele.
O garrafeiro da rua Capitão Salomão?
Um jingle de Vivaldi gravado por Jair Rodrigues, bossa para atrair garrafas de cristal e garotas jambetes.
O pintor de vanguarda?
Uma caixa de chocolates de que saía uma lagartixa vermelha em ritmo de iê-iê-iê, badalando esta inscrição na cauda: “44 x 22 HP — Olhai os lírios da Indonésia”. Para pôr na parede.
O jardim do Campo de Santana?
O carro do imperador da Golconda Maior, passando todo em ouro e glória pelas alamedas abandonadas, e o imperador mandando parar e descendo para consolar uma cutia e um gato sarnentos à beira do lago.
O bom carteiro Edoclécio?
Autorização escrita, com firma reconhecida em cartório, dada pelo diretor do DCT, que naquele ano era o D. Abade de São Bento, para rasgar e jogar fora todas as cartas de cobrança, de rompimento de amor, de notícias tristes em geral, inclusive as Cartas Magnas que traduzem pensamentos mínimos.
O velho leão do Circo Esmeralda?
Passagem aérea de ida para Quênia, sem obrigação de volta, se lá encontrar amigos de infância e tiver alegria em permanecer ao lado deles.
Papai Noel?
Lâminas de barbear, camisas-esporte, bermudas e licença-prêmio para o resto da vida.
Paulo Autran?
Bate-papo com o velho Willie, pela noite adentro, numa taverna de Stratford-do-Avon, entre goliardos.
A mocinha que estreou com um romance-rio intitulado A pílula não resolveu o meu problema?
Uma poltrona azul na Academia de Letras, para tomar chá em companhia de Austregésilo e Marques Rebelo, na qualidade de titular.
O poeta experimentalista?
Um grilo, capaz de fazer, melhor do que o computador eletrônico, o verso não- verso que ele anda procurando.
A sereia do litoral do estado do Rio?
Um cantinho da Floresta da Tijuca, para repousar de seu batente marítimo.
O Vietnã?
Um feriado de guerra, entre dois bombardeios. Com direito a música.
E tanta coisa mais que não cabe aqui, naquele tempo maravilhoso.