Imagens imparciais

O editor José Aguilar enviou a este cronista um exemplar da Obra completa do sr. Carlos Drummond de Andrade, publicada na coleção “Biblioteca Luso-Brasileira”. O volume contém matéria de 11 livros de poesia, quatro de crônicas e um de contos, além de versos inéditos. É apresentado pelo acadêmico Afrânio Coutinho, diretor da coleção, e inclui estudo crítico do sr. Emanuel de Moraes, fortuna crítica, cronologia da vida e da obra, iconografia e bibliografia. Tudo isso deu um volume maneiro de 959 páginas em papel bíblia, embora, evidentemente, não deva ser considerado suplemento às Sagradas Escrituras.

Conheço de longa data o autor. Falamo-nos pouco e não vou muito com a sua cara, mas isso não impede que eu dê notícia de sua obrinha, com a isenção e a objetividade que devem caracterizar o ofício informativo. Assim, direi de saída que os admiradores e os desadmiradores do escritor encontrarão no volume aquilo que mais lhes agrada — os primeiros para guindá-lo de foguete aos píncaros da lua, os segundos para o recolher a um oitavo círculo do inferno, privativo dos pobres-diabos das letras.

Qualquer dessas operações encontra justificativa nos mesmos textos do sr. Drummond, que o partido X acha genial, e o partido Y, debiloide. Este dualismo de apreciações perdura há 35 anos, não sei se cultivado pelo autor, que dizem pouco amigo de explicar-se, quando não se explica em demasia através de confidências poéticas a que costuma dar o título de Claro enigma ou de Pedra no caminho, ou as atribui a um suposto José, talvez para esconder, sob a simplicidade do nome, insabidas e quintas intenções. Daí formar-se terceira corrente, que prefere qualificá-lo: ni ange ni bête, farsista. Nada disso, pondera uma corrente derradeira, a dos moderados; é apenas mais um com a mania de botar coisas no papel, com defeitos e qualidades normais: deixá-lo!

Não serei eu quem o julgue; registro. A cronologia de sua vida não é a de um Ulisses ou a de um Byron, homens de ação direta; nosso bardo velejou em mansos mares burocráticos, jornalísticos e radiofônicos. A iconografia magra, como convém à sua magreza. A bibliografia, do contrário, é gordota, abrange tanto coroas de louro como pau no lombo, confirmando o que eu disse: serve para vexilários e contemptores, abrindo ainda margem à verificação crítica.

E assim temos o vate-contador-croniqueiro itabirano au grand complet, encadernado em fatiota elegante e de preço alto, como é de moda e preceito. Para encher o espaço que falta, reproduzo um inédito do livro — a saudação a Teresa, dama que segundo me informa, devia estar a esta hora no Rio, como carioca absoluta, de nascimento e estilo que é, ajudando a soprar as 400 velinhas da cidade, mas que se limita a mandar, de Moscou ou Bombaim, boas festas aos amigos. Não, não transcrevo nada, o espaço acabou, e chega de dar colher de chá a esse autor.

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