Fonte: Caderno B, coluna "O Homem e a Fábula", Jornal do Brasil, de 1/12/1961.
Começa em Copacabana o movimento comercial mais intenso do ano. Esta é a melhor época para se fazer um longo passeio durante a tarde. Elas surgem nos seus estampados vistosos, queimadinhas e decotadinhas, satisfeitas porque possuem um corpo, as mulheres mais elegantes e cheirosas do país! Olham-se nos reflexos de todas as vitrinas; só depois é que reparam nos artigos que estão lá dentro. Fazem planos e cálculos para que o dinheiro não acabe antes de ser vista a última loja. Acompanhemos uma delas e vejamos como procede.
Em primeiro lugar, verificar nos espelhos se é preciso retocar a maquilagem. Em segundo lugar, examinar um por um os artigos da loja. Isto é muito caro; isto é muito barato. O mais caro e o mais barato ficarão para o fim. Isto é lindo, mas ainda vou pensar um pouco: o mais lindo também ficará para o fim. E aquilo que as outras estão examinando? Então a nossa amiga se aproxima, finge que está olhando outra coisa e observa a outra mulher pechinchando. Sente prazer em pensar que a outra é uma sovina de marca; mas ao mesmo tempo sente inveja porque ela própria gostaria de ser assim: “Meu Deus, como sou boba! ela vive pensando. Qualquer conversa de comerciário me engana”.
Outra preocupação importante é encontrar um presente que faça o marido ficar muito contente. Quando se encontra esse presente, é mais fácil gastar todo o dinheiro... em outras coisas, porque ele não vai ficar zangado. Chama-se a isto lei das compensações.
Há lojas onde ela vai para contemplar o belo rapaz que atende às freguesas; em outras, entra porque há muito espelho lá dentro. Há outras onde não deixa de ir porque todas as suas conhecidas vão e dizem que é uma excelente loja.
Depois de correr todas as lojas, ela percebe que não comprou nada ainda. Então volta e vai pedindo os artigos que a haviam atraído. Muitas vezes adquire uma coisa de que não precisa ou de que não gosta, só porque o preço está convidativo. Depois de comprar, começa a pensar nas pessoas que poderiam ser presenteadas com esse artigo, que para ela é inútil.
No fim da tarde, quando sopra uma brisa quente, ela volta cheia de embrulhos com a cabeça doendo de tanto pensar: “Qual foi mesmo a coisa que eu ia comprar e acabei esquecendo?”