Estou nesta seção limitado ao norte pelo título desta crônica domingueira. Agora, por exemplo, não sei até onde as imposições de uma Semana Literária correspondem à figura de Emílio Moura. De quem vou falar. É que o poeta Emílio Moura, depois de quase dez anos vividos discretamente nas montanhas mineiras, mantidos em rigorosa abstinência de litoral, desceu à semana passada na estação de Dom Pedro, andou uns quatro dias pelos bairros do sul, a bebericar um chopezinho mais exagerado e, de repente, fugiu. Fugiu, poeticamente fugiu, não avisando a ninguém de sua partida, protegido pela madrugada. Como depois verificamos. Aqui aportou ele numa das últimas manhãs de abril. Estava triste e com fome. Fomos com ele a um restaurante, aonde ele deixou exclusivamente a fome. Experimentamos para a remanescente tristeza a terapêutica do mar em Copacabana. Foi pior: ficou mais triste. À noite, estava arrasado por completo. Convocamos gente. Chegou o poeta Carlos Drummond, seu velho amigo, o Carlos dos casos emilianos. Chegou o poeta Vinicius de Moraes, secreto amigo do confrade mineiro desde uma viagem a Belo Horizonte, em que ambos se confraternizaram no clima poético dos pileques noturnos. Pedro Nava não pôde vir, estava gripado, ficando a bradar no telefone que fôssemos mais compreensivos, que levássemos o poeta até a casa dele (Recusamos todos a aleivosa proposta). Outros poetas e prosadores se reuniram ao bando. Que entrou imediatamente a beber cerveja e conversar.... Mas Emílio estava triste. Pelo meio da madrugada, estávamos todos tristes, a comer sardinhas, tristes num melancólico botequim de Copacabana.
E triste continuou o poeta nos dias seguintes. Na noite que precedeu a fuga, confiou-me ele o motivo de seu desajustamento. Lamentava não ter trazido os filhos, os pinguins, como ele chama a uma meia dúzia de garotos. Tanto mar, tanta areia! Era um crime não ter trazido os meninos! E fugiu, preferiu ir-se embora ao remorso de ficar espiando uma praia vazia, de que os pinguins poderiam tomar conta.
Se isto não pode ser para todos o acontecimento da Semana Literária, o cronista se desculpa. Para mim, entretanto, não havia outra saída. Os olhos de Emílio Moura postados na orla branca do mar não eram apenas o acontecimento da semana: era a coisa complexa, feita de tristeza, nostalgia e sentimentos confusos: a que o vulgo denomina poesia.