Na Academia Brasileira de Letras há um marco. Neste marco, uma inscrição. Nesta inscrição, um verso de Castro Alves, apontado como o mais belo da poesia brasileira. É aquele célebre “Auriverde pendão de minha terra”. Com todas as honras e celebridades, entretanto, é forçoso negar ao decassílabo do poeta baiano estas excelências superlativas. O verso não vale tanto, nem pelo sentido nem por quaisquer assonâncias particulares. Aliás, sentido ele não chega a completar: não passa de uma metáfora vocativa, escrita, na verdade, com uma alegre precisão vocabular. Mas é só.

Esta história de melhor verso não pode ser levada muito a sério. O estudo, porém, dos melhores versos é tarefa interessante, porquanto revolve todos os conhecimentos de estética literária precisados até hoje. Às vezes o verso vale pelo ritmo. Um dos Alexandrinos de Baudelaire tornou-se singularmente famoso pela riqueza de unidades rítmicas: “Tu fais l'effet d'un beau vaisseau qui prend le large”. Este verso se mantém em quatro modos: duas sílabas, quatro sílabas, seis sílabas e doze sílabas. A escolha dos melhores versos é um ótimo exercício para se ver o grau de sutileza poética de cada um. E as crenças poéticas de cada um. Diga-me que versos você prefere e lhe direi quem você é, literariamente. Duas famílias se distinguem imediatamente: a dos que amam os versos “humanos” e a dos que amam os versos artísticos, isto é, os versos que se utilizam de elementos encantatórios peculiares à palavra. Os primeiros gostam de coisas assim: “Console-moi a soir, je me meurs d'espérance”. Os segundos, com incompreensão por parte dos primeiros, perdem-se de amores por um “Bibelot aboli d'inanité sonore”, ou um “la fille de Minos et de Pasiphae”.

O cronista Rubem Braga acha que o mais belo verso da língua portuguesa é o seguinte: “La luz del entendimiento me hace ser muy comedido”. Esta é a luz que guia Rubem Braga.

Por minha parte, há um verso de Gonçalves Dias que eu adotei para meu uso particular: “Timbira ― disse o índio enternecido ― és um guerreiro ilustre. “Guerreiro ilustre” é arte literária perfeita. Além disso, em momentos de depressão ou de luta, a fórmula é ótima para revigorar o moral. “Sou um guerreiro ilustre”! ― Aconselha a todos que repitam três vezes esta fórmula pela manhã, à tarde e à noite. Nesta época de filas e de sacrifícios seria uma ótima política nacional espalhar pelo país tabuletas com a inscrição: “és um guerreiro ilustre”. A gente iria passando, casmurro, daria com os olhos no dístico, sorriria confiante e seguiria caminho orgulhoso de si mesmo. Isto auxiliaria a batalha da produção. A literária inclusive.

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