— Que beleza de umbigo, moça. É natural? 

A pergunta foi feita no baile do Copa, e a interpelada riu, mas não quis responder. Deixou o curioso na dúvida. Há umbigos tão lapidares que não parecem obra de médico obstetra, mas de cirurgião plástico, ou, quem sabe, de decorador.

O umbigo é um dos vencedores do Carnaval de 1963. Já fizera sentir o seu charme insólito nos carnavais anteriores, mas no de agora é que pudemos admirá-lo em toda a sua capacidade de divertir-se, de criar e de transmitir alegria às demais partes do corpo e, em cadeia, aos demais corpos.

Não quero dizer que o Carnaval transcorreu à base de umbigo, nem que este proliferou por aí em demasia. Os espécimes não eram incontáveis, mas eram quase todos selecionados. E, na seleção, mostraram sua variedade.

Parece fora de dúvida que o umbigo não é mais uma reminiscência da vida preliminar, a cicatriz consequente a um corte. É mesmo o ponto central e radiante do corpo feminino (quando me refiro a umbigo, é sempre feminino), como por extensão se diz de um ponto geográfico que ele é o umbigo da terra: Paris já foi umbigo do mundo, o qual, com certo incômodo, tem hoje dois umbigos: Nova Iorque e Moscou, e se vê ameaçado de ganhar um terceiro, chinês.

O fato é que, no Municipal e nos outros bailes, os tivemos bem luzidos, como estrela, joia ou amêndoa engastada na suave proeminência do ventre: uns, rigorosamente esféricos, outros alongados vertical ou horizontalmente, pulando e dançando por conta própria, numa pulsação que se comunicava à plataforma continental e daí ganhava o mundo largo do salão. Nesse arfar, ora se projetavam ora se escondiam em ritmo, e não garanto, mas era como se tivesse deles a voz do samba: “Eu agora sou feliz”!

No teatro rebolado, essas expansões resultam de espetáculo ensaiado, dirigido, e não refletem a festiva espontaneidade umbilical; na praia, o umbigo simplesmente se estira ao sol ou passeia com circunspecta inocência, e no máximo se permite furar uma ou outra ondinha leve. No carnaval é que ele revela sua índole dionisíaca, apesar de tudo, casta. Sim, casta. Não é preciso insistir no equívoco da roupa como escudo de pureza, da roupa às vezes tão marota pelo que esconde e sugere. Já aprendêramos isso, pelo contraste, no Arpoador e em outras universidades. A lição do Carnaval — uma de suas lições — é a elevação da alegria ao nível do esporte, sem perda de sua raiz instintiva — e para isso resultado saudável o umbigo traz sua contribuição. Já estou vendo despontar, em 64, a Rainha do Umbigo.

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