Crônica diária cria o problema diário da vaidade, balão que se entumece ou esvazia ao sopro cálido do elogio ou ao bafo danoso da censura.

Esse não é o nosso jeito de escrever: entra nele um pouco da ênfase frouxa de uma gripe funesta. Mas, como dizíamos, crônica diária cria o problema diário da vaidade, e a vaidade costuma talhar temperamentos mais diversos, inclusive a modalidade dos cronistas de todo indiferentes às críticas e louvores. É o tipo extremo, uma espécie de desespero da vaidade. O tipo contrário será talvez o do escritor que prefere o elogio mentiroso, convencional ou calculista, a uma crítica honesta e procedente. Antes de darmos opinião sobre o que escreveram, tomamos todas as precauções para que a boca se abra somente para gabar, que se mantenha fechada no caso de alguma dúvida ou troque a repreensão em um sorriso amigável: Se desembolsam um poema, eles nos subornam antes com elogios a nosso último artigo, ou à nossa gravata, invocam a autoridade dos maiores dizendo que Manuel Bandeira gostou muito do poema em apreço e, sobretudo, põem uma tal doçura angustiada no olhar que o nosso espírito crítico falece, o nosso feroz desejo de destroçar o fulano se transforma em ternura.

Até aqui, a vaidade; relacionada a ela, uma explicação. Vieram dizer-nos que as nossas crônicas estavam muito à margem de. Lógico, rapaz. Ainda não nos foi possível engrenar na vida teatral do Rio; depois que iniciamos a seção, só nos foi dado assistir à uma estreia: sem assunto, a crônica não anda e só pode aborrecer o leitor e a nós. Mais tarde, haja material, seremos tão objetivos e a propósito quanto pudermos. Esperando que a supracitada gripe, mãe da leviandade jornalística, tenha ido embora.

paulo-mendes-campos
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